Opinião
Conversando
com um amigo por telefone, ele observou “ agora
sim, entramos no século XXI ”. Logo fiz coro com ele. Poderíamos associar
como significativo da mudança de século, quem sabe, o setembro de 2001 com a
queda das torres gêmeas ou aquele tsunami no Japão ocorrido em 2011, mas
em mim bateu forte: o que caracterizou o
nosso salto de século foi esse tal de coronavírus.
Entramos no
século XXI vinte anos após o seu início e com o pé esquerdo. Esse vírus irá
jogar-nos nesse século como aquelas cenas hollywoodianas de gladiadores que
são jogados nas arenas dos coliseus romanos esperando o que sairá dos tantos buracos que os cercam.
Por ora
ainda estamos nos porões, tratando nossas feridas e insalubridades. Aqui, isolados
nos bastidores, enfrentamos o vírus. Alguns ele eliminará. Os sobreviventes ele
empurrará para a arena e lá, dos malditos
buracos é que sairão os leões, tigres, carruagens ocupadas com
guerreiros, enfim qualquer coisa com o potencial de detonar nossas vidas.
Será lá, na arena do pós-isolamento que as lutas efetivamente acontecerão, e acho que
deveríamos falar sobre isso.
Não faço apologia
do caos nem rendo tributos ao pessimismo, mas estamos vivendo uma situação que,
independentemente de nossas vontades, empurra-nos para um estado de lassidão
que retira a nossa energia e vontade de pensar o futuro. Então, acho importante
tratar esse assunto desde já, inseri-lo em nossas conversas como forma de
reação e de organização para os tempos que virão.
Não haverá uma
chave ON – OFF que nos desligará do hoje conectando-nos imediatamente com o
amanhã. Passada essa fase de isolamento, não despertaremos em um mundo novo,
com as coisas no lugar, como se estivéssemos retornando às nossas casas ao fim
de uma viagem. Pensar assim é um engano.
O ambiente
pós-isolamento, ao que tudo indica, será difícil e confuso. Enfrentaremos o
prolongamento da recessão econômica na qual já entramos. Enfrentaremos o
desemprego. Mesmo pessoas que hoje ocupam cargos relativamente estáveis e bem
remunerados serão dispensadas. Isso está ocorrendo em algumas cidades do
exterior.
O conjunto
de interesses representados por corporações econômicas privadas e um minúsculo grupo
de biliardários aos quais nos referimos genericamente como “sistema capitalista”
não interrompeu os seus mecanismos e avançará em seus objetivos, apertando cada
vez mais os torniquetes de exploração dos trabalhadores.
Muitas
serão as pessoas que revisarão os seus conceitos na vida pessoal e na vida
social (política), para o bem e para o mal. Haverá uma migração em ambos os
sentidos. Muitos estarão perdidos procurando por um mundo que não existirá.
Os idosos, eu
inclusive, estaremos mais expostos. O vírus estará por aí, possivelmente
derrotado pelo processo de adaptação do ser humano e dos seus recursos
científicos e tecnológicos, mas ainda caçando presas entre os mais frágeis das manadas – os idosos.
Abraçar um filho ou um neto será um risco para os idosos que estarão obrigados
a se manterem distante sei lá em que condições e por quanto tempo mais.
É um
cenário esquisito, mas bem possível. Alguns já perceberam as perspectivas
futuras e, os que podem, ocupam o seu tempo reunindo riquezas acumuladas já
pensando no porvir. Outros nem pensaram no assunto, acreditam e
esperam a virada da chave liga-desliga.
Em casos de
barbárie a regra é sempre cada um pra si, mas acho que o nosso rumo será outro,
e no rumo que estaremos o individualismo e a solidariedade serão escolhas
possíveis. A luta continuará, então precisamos conversar sobre ela.
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A luta continuará e nos encontrará cansados, inclusive emocionalmente cansados. Textos como este seu são gritos de "basta!" para nossos desânimos. Nos fortalecem. Precisamos nos cuidar bem, para a luta de agora e a que virá. Ler seus textos ajuda muito. Obrigada!
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