sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Paladino – passando e contando o tempo.

 

Leituras para distrair

Aniversários de nascimento são eventos de simbolismo muito forte em nossa cultura. São várias as formas de celebrações, assim como as reações emocionais dos aniversariantes, mas nunca somos indiferentes às datas que marcam a passagem das nossas vidas intrauterinas para a realidade social.

Tenho pensado no simbolismo dessas datas para os pais dos aniversariantes. O nascimento de um filho é um marco indelével na vida dos pais, não importa a situação da relação amorosa que deu origem ao nascimento. Também para os pais é dia de pensar e refletir: sobre o fato, as circunstâncias, sobre como era o olhar para o mundo na ocasião, as expectativas, os planos e a realidade atual, entre outros. São reflexões que acompanham os pais por todas as suas vidas e são distintas das reações e sentimentos dos filhos aniversariantes.

Acho que, via de regra, essas distinções não são percebidas, e país e filhos reagem como se a data tivesse o mesmo simbolismo para ambos. O nascimento de um ser – e os seus aniversários - tem significados diferentes para o nascido e para os seus pais, ainda que compartilhem relações sociais e afetivas ao longo de suas vidas.

Os aniversários dos meus filhos são também celebrações minhas, mas sem compromissos com as reações de cada um deles possa ter em suas datas natalícias. Tomara que sejam felizes, parabéns para eles e blá, blá, blá, mas as minhas celebrações são outras.  Faço minhas revisões, autocríticas, considero  os sucessos e insucessos dos planos, as novas perspectivas e, obviamente, sempre que possível, beberico uma cachaça, ritual do qual não abro mão.

A atenção sobre esses detalhes é recente para mim. Não me lembro de alguma vez ter celebrado com amigos, sob essa óptica, as datas do aniversários de nossos filhos, embora possivelmente tenhamos comemorado juntos os mijos dos bebês e conversado sobre o marco daqueles eventos em nossas vidas. Nem mesmo nas posteriores festinhas de crianças (geralmente chatas pra cacete) tratamos esse assunto.

Claro que essas divagações de pensamentos são de importância descartável em meio a tantas questões de maior valor para tratar. Mas, a velhice é assim! As divagações se desculpam por sua própria natureza. Caduquices!

 Celebrava sozinho o aniversário de um filho no Paladino, boteco tradicional no centro do Rio de Janeiro, e me dei conta que a celebração era efetivamente minha. Pensava sobre esse complicado ano terceiro da pandemia, lembrando que muitas vezes ainda me refiro como "meninos" aos filhos que já contam mais de 40 anos e que até já me deram netinhos. Aproveitei e registrei essas notas enquanto saboreava uma fritada de sardinha nacional, uma cachaça Magnífica e um chope. Pensei comigo: parabéns aos meus amigos por seus filhos!




domingo, 23 de janeiro de 2022

Elza Soares

Leituras para distrair 

Não estou entre os admiradores da Elza Soares cantora. Longe de negar seus atributos artísticos, apenas nunca me encantaram. Minha referência sempre foi a de uma artista popular de sucesso em minha infância, e com características próprias nas suas interpretações. Foi bem tarde, após 1995, e ainda sem me incluir na galeria de seus fãs, que me interessei pela personagem Elza Soares.

Em 1995, o jornalista Ruy Castro publicou o livro "Estrela Solitária - Um Brasileiro Chamado Garrincha" (Companhia das Letras). Não gosto de futebol, mas sempre me impressionei com o mito Garrincha, e a leitura de sua biografia, numa época em que eu viajava bastante, foi uma distração. Pequeno mergulho num trecho da história desse esporte que afeta culturalmente qualquer brasileiro, mesmo os que cagam e andam para ele, como é o meu caso.

O livro é interessantíssimo, tanto pelo personagem e sua história, como pela narrativa do autor, um dos tantos trabalhos brilhantes do Ruy Castro. Trata-se de uma obra que está bem além de ser exclusiva para os amantes do futebol.

Foi lendo a biografia do Garrincha que soube do papel da Elza Soares na vida desse mito nacional e, consequentemente, do caráter especial dessa personagem. Uma surpresa que talvez tenha me impactado mais do que o personagem biografado. A partir de então, todas as vezes que em conversas surgiu o nome do jogador ou da cantora, resgatei as minhas leituras da biografia do Garrincha e da figura especial da Elza Soares.

A carreira longeva e os seus méritos artísticos – e agora o seu falecimento -  fizeram com que a história de vida da Elza Soares tenha sido resgatada com bastante divulgação. Contudo, ainda assim guardo comigo o destaque de figura humana que foi recuperado pelo Ruy Castro. A admiração pelo mito Garrincha é quase uma unanimidade nacional e seria muito legal se os seus admiradores conhecessem o papel da artista na história do deus de pernas tortas. Quem sabe, não passaria de um alcoólatra decaído e esquecido, se uma Elza Soares não tivesse existido em sua vida.

Minhas preferências artísticas não mudaram, e cada vez gosto menos de futebol, mas a admiração pela Elza Soares ficou. ###

sábado, 15 de janeiro de 2022

Houve uma época em que o mundo parecia simples

Leituras para distrair

 

Achei esse texto legal e copiei para compartilhar. Gosto muito do autor e lembrei-me de um monte de gente que guardou da física a imagem daquela disciplina obrigatória e aporrinhante do ensino médio. 

 

Houve uma época em que o mundo parecia simples

Autor: Carlo Rovelli [1]

 Na época em que Dante escrevia, pensávamos o mundo na Europa como espelho embaçado de uma grande hierarquia celeste: um grande Deus e suas esferas de anjos levam os planetas em sua corrida através do céu e participam com entusiasmo e amor de nossa vida, da vida desta frágil humanidade, que no centro do cosmos oscila entre adoração, rebelião e arrependimento. 

Depois mudamos de ideia. Nos séculos subsequentes, compreendemos aspectos da realidade. Descobrimos gramáticas ocultas, encontramos estratégias para nossos objetivos. O pensamento científico construiu um complexo edifício de saberes. A física foi a força motriz e unificadora, oferecendo uma imagem nítida da realidade: um vasto espaço onde correm partículas, impelidas e atraídas por forças. Faraday e Maxwell acrescentaram o "campo" eletromagnético, entidade difundida no espaço através da qual corpos distantes exercem forças um sobre o outro. Einstein completou o quadro, mostrando que também a gravidade é levada por um "campo": um campo que é a própria geometria do espaço e tempo. A síntese é clara e encantadora. 

A realidade é uma estratificação exuberante: montanhas nevadas e florestas, o olhar dos amigos, o estrondo do metrô nas sujas manhãs de inverno, nossa sede irrequieta, o deslizar dos dedos na tela do celular, o gosto do pão, o sofrimento do mundo, o céu noturno, a imensidão das estrelas. Vênus brilhando solitária no céu azul ultramarino do cerpúsculo... Pensávamos ter encontrado a trama de fundo desse pulular caleidoscópio, a ordem oculta atrás do véu desvendado das aparências. Era o tempo em que o mundo parecia simples. 

Mas, para nós, minúsculas criaturas mortais, as grandes esperanças não passam de breves sonhos. A clareza conceitual da física clássica foi varrida pelos quanta. A realidade não é como descreve a física clássica. 

Foi um despertar brusco do sonho feliz em que nos tinham embalado as ilusões do sucesso de Newton. Mas é um despertar que nos leva ao coração pulsante do pensamento científico, que não é feito de certezas adquiridas: é um pensamento em movimento contínuo, cuja força é precisamente a capacidade de recolocar sempre em discussão todas as coisas e começar de novo, de não ter medo de subverter uma ordem do mundo para buscar uma mais eficaz, e depois voltar a colocar tudo em discussão, subverter tudo de novo. 

Não ter medo de repensar o mundo é a força da ciência: desde que Anaximandro eliminou as colunas na qual a Terra se apoiava, Copérnico a pôs a girar o céu. Einstein dissolveu a rigidez da geometria do espaço e do tempo, e Darwin desmascarou a ilusão da alteridade dos humanos... A realidade se redesenha continuamente em formas cada vez mais eficazes. A coragem de reinventar profundamente o mundo: esse é o fascínio sutil da ciência que capturou as rebeliões da minha adolescência... ###

 

[1]

Copiado, sem autorização, do livro "O abismo vertiginoso – um mergulho nas ideias e nos efeitos da física quântica" – Carlo Rovelli – Ed. Objetiva 

Carlo Rovelli é físico teórico italiano, membro do Instituto Universitário Francês e da Academia Internacional de Filosofia da Ciência, professor do Centro de Física Teórica da Universidade Aix-Marseille. Especialista no estudo da gravidade quântica.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2022

Ensaboa

 Opinião 

O Bozo é uma figura política tão escrota que até mesmo a Globo, com todo o seu histórico de escrotidão jornalística, consegue fazer manifesto apontando as os seus crimes sem a necessidade de manipulação editorial.

O gado não sabe bem como agir. Parte dele, assumido, abaixa a cabeça e espera. Responderá ao comando do ferrão dos seus condutores. Irá para aqui ou acolá conforme for ferreteado. Mas, há também um gado que disfarça a sua condição de simpatizante, sem assumi-la.

Um personagem de novela que fez  sucesso no início dos anos 70, era um bicheiro com o cacoete lavar as mãos a todo o momento. Sofria de um transtorno obsessivo-compulsivo que o obrigava, em intervalos de minutos ou em pausas de conversas,  buscar um lavatório onde ensaboava, lavava e secava as mãos. Era o Jovelino Sabonete interpretado pelo falecido e brilhante ator Felipe Carone na novela Bandeira 2.

O gado simpatizante me faz lembrar o Jovelino Sabonete. São identificados ideologicamente com o Bozo, mas buscam obsessiva e compulsivamente lavar as mãos como forma de disfarce, geralmente ensaboando-se no lavatório do discurso antipetista. Passam todo o seu tempo divulgando propagandas pró-Bozo, mas sempre tentando lavar os rastros fascistas de suas opções com mensagens anticorrupção, de criminalização da política, além de outras.

Apregoam-se como descomprometidos, mas suas práticas os desmentem. Não perdem a oportunidade de encher a bola de personagens caricatos tipo bias kicis ou o papagaio da havan e, volta e meia, uma fakenewsinha como se não soubessem sobre a falsidade da sua origem. Ora é o STF corrupto, ora é o Lula ladrão, ora é a Globo comunista, enquanto garimpam sem sucesso alguma coisa que preste no lodaçal político do governo Bozo.

Os ataques contra os direitos dos trabalhadores; contra os grupos discriminados que buscam representação política; o genocídio decorrente das ações e omissões na governança da área de saúde; a campanha e o boicote à vacinação em massa e, agora, o crime do boicote à vacinação infantil -  nada disso tem sido suficiente para o gado bozista dar conta de si. Nem mesmo os que correm para os lavatórios ensaboando-se em discursos precários e de conteúdos que oscilam entre a ignorância e a burrice. Fascistinhas sabonetes!

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