Opinião
Dificilmente se poderá dizer que as manifestações
do último dia 15 de março de 2015 não foram manifestações da direita política
brasileira, por mais que alguns manifestantes e apoiadores reajam a esta
classificação disfarçando-se em movimentos que tentam qualificar como
“apartidários”. Trata-se de uma parcela
da sociedade descontente com a existência de um governo que traz consigo,
congênitos, cacoetes e compromissos
públicos defesa dos pobres e trabalhadores, ainda que não os cumpra como
deveria. Para a direita, a possibilidade desta transformação (que implica
necessariamente em distribuição da riqueza) está no governo e pode ser vista
crescendo. É como se o governo Dilma fosse, para a direita reacionária, a sua
versão de ovo da serpente. A direita dá mais crédito a uma possível metamorfose
das políticas de governo do que os próprios partidos de esquerda que também
fazem oposição, mas justamente cobrando esta transformação. Com esta visão, a
direita quer extirpar o governo, não importa se ele resulta da vontade da
maioria.
Demonstração cabal deste fato foi o contraste entre as reações de
repulsa e ódio contra os provocadores que, indevidamente, insistiram
em exibir a cor vermelha nas manifestações e a tolerância para com as evocações de volta à ditadura e ao intervencionismo
militar com a deposição da presidenta eleita. As apologias da violência contra
comunistas e petistas, as incitações de violência contra o MST, as divulgações de
mensagens e símbolos nazistas, entre outros, estavam lá,
confortavelmente exibidas ao lado dos democráticos e “apartidários”
manifestantes. As TVs até tentaram minimizar a ocorrência dessas manifestações, mas não conseguiram justamente porque foram muitas, e a realidade irrefutável é que elas foram acolhidas pelo “movimento”.
A nossa sociedade não vivenciou guerras, não
enfrentamos catástrofes ambientais e nos formamos com uma enorme diversidade de
costumes, mas sempre em torno de uma integração cultural desde o norte até o sul
do país. As nossas verdadeiras revoltas políticas, apesar de terem tido caráter
popular, sequer chegaram a ser caracterizadas como revoluções. Foram reprimidas
e dizimadas com tamanha força e violência que sequer ficaram resquícios
suficientes para nos dividir, como sociedade, em grupos de opções políticas. Assim,
depois do maior período de democracia formal da história republicana, nossas
últimas e significativas experiências políticas foram disputas eleitorais.
Disputas que atingiram um acirrado enfrentamento nas últimas eleições e que geraram
conflitos que estamos vivenciando como uma novidade. Mas, queiramos, ou
não, a realidade é que há divisões enormes de pensamentos entre nós
(brasileiros) que, de uma forma ou de outra, precisam aflorar, se mostrar.
Estes conflitos estão repercutindo em nossos
ambientes de coexistência. Entre os colegas de trabalho, nos ambientes
escolares, entre familiares, amigos, vizinhos ou companheiros de bar. E possivelmente
nos agrupamentos religiosos onde a instituição religiosa não constitui, ela
própria, uma organização de caráter partidário oficioso. Não tenho expectativas que tenhamos
maturidade para tratar tais questões. Elas são emergentes, e esperar a
maturidade seria uma contradição. Tomara, sim, que estes grupos tenham
desenvolvido valores comuns consistentes que sirvam de sustentação
e coesão social durante o tempo que precisarmos para amadurecer e avançar em
nossas disputas, sem precisar chegar a um esfacelamento completo das nossas relações. Mas, não tenhamos dúvidas, vivemos um momento de apartação
decorrente das nossas escolhas políticas, e os movimentos de 15 de março,
último, e outros que estão sendo anunciados são expressões da direita
tradicional retrógrada e reacionária, embora alguns manifestantes permaneçam
enrustidos.
O falecido Leonel Brizola, em suas tiradas irônicas
e cáusticas, dizia nestas situações: “tem olho de jacaré, boca de jacaré,
balança o rabo igual a jacaré ... e você quer me convencer que não é
jacaré?"
###