Leituras para distrair
Recebi
a foto de um kit, que o remetente ironicamente identificou como “kit Jorge”, contendo
uma lata de pinga Pitú e alguns cajus. Gostei da brincadeira e fiz alguns
comentários.
Eu não
pratico tanto, mas gosto de um caju amigo. Uma peça carnuda de caju cortada em
filés sobre uma tábua de madeira, uma boa pinga, e o momento máximo: mastigar
um filé de caju e, em seguida, degustar a pinga. Uma delícia! Ainda que
possa ser um atentado contra a saúde.
Conheço
pessoas que invertem o ritual. Primeiro a pinga e, depois, o caju como um
tira-gosto. Não é o meu caso, mas é besteira discutir este detalhe. Vale o
prazer.
Não é um ritual para se praticar sozinho. Eu e um antigo companheiro, cujo contato perdi, praticávamos o caju amigo em uma pequena propriedade que tive e que chamávamos de “sitio”.
Não é um ritual para se praticar sozinho. Eu e um antigo companheiro, cujo contato perdi, praticávamos o caju amigo em uma pequena propriedade que tive e que chamávamos de “sitio”.
O caju
amigo me traz duas lembranças especiais. Uma delas, como não deixaria de ser, é
gonçalense. Ainda estávamos no colegial, lá em São Gonçalo, quando íamos ao bar do Adelino, na Vila (Zé Garoto), e bebíamos um caju
amigo, eu e o meu querido e falecido compadre. Lá o caju não era servido em
filés, era espremido em um copo do mesmo tipo onde era servida a pinga. Copo
simples, de fundo alto, antes era chamado copo de cachaceiro, hoje é chamado de
shot. Ali, em pé, no balcão, bebíamos em dois goles. Meu compadre bebia
primeiro a cachaça, eu bebia primeiro o caju, a pinga ia em seguida. Hoje o Adelino seria preso por vender bebida alcoólica a menores. As
conversas, as piadas, as expressões e comentários eram sempre os mesmos. Tudo
fazia parte do ritual. Um dos tantos rituais que consagraram uma amizade que só
me trouxe felicidade.
Outra
lembrança é de uma tarde em um local distante, uma quase esquecida estação da
Embratel, em Boa Vista, Roraima, ou Macapá, Amapá. A memória é falha, e nunca
mais voltei lá. Era uma estação dos antigos sistemas de tropodifusão com suas
antenas lindas, erguidas como enormes muralhas de metal no espaço e que
pareciam peças de ficção científica. Poucos profissionais de telecomunicações tiveram a oportunidade de conhecer aqueles equipamentos que eram a alternativa de comunicações na amazônia antes do advento do satélite.
O
terreno lateral ao da estação continha vários cajueiros e uma mangueira enorme com uma sombra magnífica. Grande o suficiente para abrigar uma birosca e
alguns bancos de madeira. Nada em volta, só mato e a casa do caseiro da estação. Não sei
de onde saía a clientela da birosca. Terminamos o trabalho e fui levado para
conhecer a birosca e o caju amigo. Uma pinga deliciosa e os tamanhos dos cajus
eram impressionantes, pelo menos para mim. Tudo se ajustava naquela
tarde, parecia um momento ensaiado. Estávamos eu, um companheiro da engenharia de Belém,
outro colega do Rio e o pessoal da estação local. O resto não preciso relatar,
nem conseguiria. Basta fechar os olhos e deixar a imaginação fluir deliciosa
como flui um caju amigo.
Sobre
o kit para caju amigo, eu já o vi no supermercado próximo ao Largo do Machado,
aqui, no Rio. Achei interessante, embora eu não goste muito do sabor da
Pitú, uma pinga pernambucana reconhecida internacionalmente. Não sei se existe
alguma Pitú especial. A comercial eu não gosto. Porém, gosto não se discute, mais
vale um gosto do que dez vinténs, como dizia a minha avó Olga.
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