Opinião
Na quarta-feira última, 20 de novembro,
o clube Renascença tinha bastante gente, mas estava vazio. Entrada franca. Teve
banda do Corpo de Bombeiros, feijoada, apresentações de conjunto de choro,
grupo de jongo, casais em dança de gafieira, roda de samba e artistas diversos.
Barraquinhas de artesanatos e diversos produtores oferecendo degustação de
cachaças da melhor qualidade. Ainda assim, vazio. Sabemos bem o que é um dia de
casa cheia no clube para fazer essa afirmação.
Ao mesmo tempo, as imagens de celular
mostravam uma multidão de torcedores acompanhando o ônibus que levava o time de
futebol do Flamengo até o aeroporto do Galeão. Uma multidão que tomava
totalmente o caminho e não distinguia obstáculos, chegando a pisotear veículos
que estavam parados atravancando o seu caminho, que derrubou grades, provocou
feridos e reação violenta da polícia.
A data em pauta foi instituída por
lei como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Aqui, no Rio de Janeiro,
é um feriado estadual e celebrada com manifestações em diversos locais, entre
eles o clube Renascença cuja origem e história transformaram o “Rena”
em um símbolo de enfrentamento dos negros contra a discriminação racial. Nesse
ano, 2019, na mesma data, a equipe do Flamengo embarcou para a cidade de Lima,
no Peru, onde disputará, hoje, 23 de novembro, daqui a pouco, com o time argentino
River Plate, a taça Libertadores da
America.
Foram duas manifestações populares.
Seria um equívoco desvalorizar qualquer uma delas em prol da outra. Dois
públicos felizes, isso é o que importa. Afinal esse é o objetivo final das
lutas sociais. Contudo, também não há como ignorar as possíveis motivações que
determinaram a opção pela participação em um ou outro evento. Um deles celebrou
a consciência. Outro foi uma manifestação explícita de alienação. Não se
comparam.
O resultado da partida de hoje,
sábado, qualquer que seja, provocará
outro impacto na vida da cidade e das pessoas. Alegrias e tristezas consoantes
com as emoções que determinam a relação dos cariocas e dos brasileiros em geral
com o futebol.
Eu prefiro ver as pessoas felizes. Então,
preciso supor que essa alegria alienada deve ser tão grande que supera a
infelicidade de um cenário sem aposentadoria, sem proteção de leis trabalhistas,
de desmonte do sistema educacional, de extinção da saúde pública através da sua
privatização, de entrega das riquezas nacionais, de subordinação ao capital
privado, de desemprego, de preconceito e discriminação social, além da criminalização
da pobreza e da miséria. Não fosse assim eu teria que classificar essas pessoas
apenas como idiotas, mamulengos de uma ordem política fascista. Não tenho essa
presunção nem acho que as decepções esportivas farão aumentar as fileiras dos
participantes ativos na vida política do país. Escolhi apostar que o
engajamento e consciência virão de outras disputas.
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