terça-feira, 27 de agosto de 2019

Liberdade – cabe no dicionário?


Leituras para distrair 


... Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.
(Thiago de Mello – Estatutos do Homem – Poeta amazonense)

Recebi esse vídeo (abaixo) de um querido companheiro dos tempos de Embratel. Lindo vídeo. Eu já tinha assistido, ainda assim fiquei emocionado. Nem falo dos arrepios que tomam conta da pele – mesmo dos comunistas avermelhados pela ideologia do folclore -  quando estamos por lá, na Amazônia. Ele é simbólico para muitos de nós. Refiro-me à minha “geração” de trabalho na Embratel, naturalmente. Outros vídeos que fossem elaborados, em outras áreas e temáticas, provavelmente teriam efeito similar [1].

Individualmente tivemos a oportunidade de vivenciar nossas carreiras profissionais em um local e período importantes. Um período de construção, do fazer o que nunca foi feito e de poder ver o feito. Temos a consciência de que fizemos o nosso melhor, e que esse melhor foi dado em troca de algo bom e para ser compartilhado por muitos. Nesse mesmo tempo, crescemos e aprendemos. Sentimos orgulho e autoestima. De formas variadas deixamos nossas marcas. Somos felizardos. Não são todas as pessoas que têm essa oportunidade. Algumas chegam a ter, mas por razões diversas não conseguem aproveitá-las, não conseguem usufruir delas. Isso valoriza o nosso sentimento.

Em grupo a oportunidade foi quase única. Empregamos nosso trabalho em uma empreitada para construir um país melhor. Em uma empresa que representava a sociedade e que trabalhava para ela. Sabíamos disso. Sempre sentimos orgulho em nos apresentar como trabalhadores daquela que era um querido símbolo nacional. A simples menção do seu nome, onde estivéssemos, era bastante para sermos distinguidos com respeito e cortesia.

Naturalmente esse processo ocorreu com distorções e equívocos, além de conflitos (muitos) entre empregados e as direções da empresa. Mas, nunca fomos alienados em relação a esses aspectos e situações. Éramos trabalhadores empregados de uma empresa pública, sob a égide de relações de trabalho capitalistas, e enfrentamos essas contradições. Ao final, foram mais lições que aprendemos.

O corporativismo entre os trabalhadores da nossa empresa sempre foi uma marca forte. Chegou a ser uma dificuldade na integração com outros trabalhadores da área de telecomunicações. Mas, felizmente, superamos e, primeiro, veio a compreensão de fazermos parte de uma categoria e, depois, uma consciência classista. Éramos, genericamente, trabalhadores. Um grande avanço. Fomos exemplos e fizemos história. Mas, no aspecto profissional praticamos um corporativismo sadio que nos fazia cobrar, uns dos outros, o melhor que se pudesse dar. O produto do nosso trabalho não podia deixar a desejar. Trabalhador cagão não se criava nas equipes!

A fibra óptica atravessando parte da Amazônia foi certamente o último projeto oriundo desse espírito de brasilidade. Uma marca que impregnou a empresa tão intensamente, a ponto de viabilizar o projeto, mesmo num período onde a ela já era de propriedade privada, e seus caminhos ditados pelos interesses particulares de acionistas proprietários.

Esse é o sentimento que muitos de nós ainda trazem consigo. Uma sensação de bem-estar. Um orgulho e vaidade despretensiosos, sem soberba nem presunção. Uma sensação boa de poder ter sido um bom profissional e cidadão.

Hoje vivemos, infelizmente, outros tempos. No caso da Amazônia, outros interesses e outros sujeitos buscam destruir ou se apropriar do que foi realizado com esforço e sacrifício de tantos, de muitos além de nós. Desde as gigantescas antenas “billboards” da tropodifusão, até o ousado e moderno “cabinho” de fibras” que, parecendo um cipó que busca o seu caminho natural, em vários trechos caminha em zigue-zag, num truque para mitigar a agressão à floresta.

Circunstancialmente, essa mesma Amazônia, cujos projetos elaborados por servidores públicos de telecomunicações trataram com tanto respeito e dedicação para integrá-la, está sendo objeto de interesses privados e literalmente queimada e destruída por esses interesses.

Não tem jeito. A alternativa é enfrentar. Se alguma transformação positiva tiver que ocorrer, não tenhamos dúvidas, surgirá na nossa capacidade e decisão de lutar.

[1]
Vídeo sobre a implantação do cabo óptico na rota Porto Velho – Manaus. Uma obra da Embratel. Modernização das telecomunicações na Amazonia. Produzido por empregados da Embratel. Disponível em <https://www.facebook.com/100007691825558/posts/3139925442692056/?substory_index=5&sfnsn=mo&s=100000682924569&vh=i> - Acesso em 27/08/2019

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terça-feira, 20 de agosto de 2019

Sem rezas e com pragas de muitos


Leituras para distrair

História triste do sequestrador da Ponte Rio - Niterói. Talvez venhamos a saber mais sobre ele, quem sabe, sobre a provável motivação de sua ação. Por ora, será tido como um borra botas. Um coitado, embora perigoso, que morreu atrapalhando o tráfego.


Nem deveria assistir TV. Teria imaginado que seria alvejado logo que se expusesse. Por um atirador de elite – cena corriqueira de filminho brega americano,  ou por um cagão fardado e sem experiência como no caso do ônibus 174.

Talvez um suicida. Burro! Idiota! Mas, a idiotice da sua ação não ficou muito atrás do gesto idiota do atirador que “comemorou” a sua derrubada.

A única coisa que fez sentido nessa história, porque é recorrente, foi o aparecimento do vendedor de coxinha ou bolinho, seja lá o que for, divulgado pelas fotos do local. Esse fenômeno do aparecimento instantâneo dos vendedores de guarda-chuvas, capas, água mineral e salgadinhos precisaria ser pesquisado por teses universitárias. Eles aparecem e desaparecem subitamente. Então, deve haver um momento zero, uma espécie de big-bang que dá origem ao fenômeno.  Os congestionamentos e a precipitação de chuvas funcionam como chaves que abrem portais de comunicação com outra dimensão onde vivem. Portais que atravessam e aparecem nessas situações.

Algumas das fotos mostram o equipamento do vendedor muito bonitinho, sem fitas adesivas remendando e envolvendo os isopores, etc. Distante da imagem comum de ambulantes. Mais para um catering de sequestro. Ao mesmo tempo, as sandálias de dedos dão uma identidade popular ao cara que está servindo as coxinhas e que parece estar sem identificação. A freguesia parece ser a moçada que estava por ali. Figurantes.  Desfaz a ideia de catering para artistas principais.

O final foi trágico. Não há o que comemorar. Sem pressa foi cada um pro seu lado. Até porque o congestionamento foi monumental. Nossas janelas de zap, instagram e facebook não há como fechá-las. Continuarão abertas, de frente para tantos crimes.

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sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Rebeldia, injustiças e afirmação


Opinião

Enquanto entregam as riquezas nacionais ao capital privado e destroem conquistas sociais, num processo que fará a população brasileira escravizada e refém desses mesmos grupos, as figuras da trupe Bozo apontam os governos passados como responsáveis pelo estado desastroso da situação econômica atual.

Esse discurso satisfaz muitos que o repetem para disfarçar seus preconceitos e para justificar seus votos nos representantes fascistas que elegeram. Porém, os fatos não endossam a opção que fizeram. Ela é desabonada tanto pelas práticas da trupe Bozo, que fazem do Brasil objeto de chacota internacional, como pelas análises consistentes de dados e informações sobre resultados dos governos passados, apesar de todas as críticas que merecem pelos os erros que cometeram e das quais não devem ser poupados.

Em sintonia com essa avaliação, chamo atenção para uma análise feita pela Gerência de Estudos e Indicadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) sobre a inclusão social no ensino superior, no Brasil, entre 2005 e 2015.

Os dados mostram que no período entre 2005 e 2015 as matrículas no ensino superior brasileiro passaram de 4,57 para 8,03 milhões, uma expansão de 76%. Porém, o mais interessante é que a análise das matrículas conforme a renda média domiciliar per capita distribuída em cinco faixas de renda, para os estudantes oriundos das famílias cujas rendas estavam nos dois grupos mais baixos, o ingresso no ensino superior teve um aumento de quase sete vezes nesse período, ou seja, 600%, enquanto para aqueles oriundos de famílias que estavam nos dois grupos de maiores renda, a expansão da entrada no ensino superior foi de apenas 35%. Uma expressiva ampliação na participação dos grupos de mais baixa renda familiar quando comparados com os de rendas mais altas, tanto na rede pública como na rede privada. Isso é inclusão social e, obviamente, não é fruto do acaso, mas decorrência de políticas públicas.

Os dados mostram ainda que a desigualdade no acesso ao ensino superior da rede pública, em 2015, medida por indicadores estatísticos de aceitação internacional, apresentou um índice baixo, típico dos países nórdicos, entre os mais baixos do mundo.
Os dados são do Censo da Educação Superior elaborado pelo INEP MEC e a análise foi publicada na última edição da revista Pesquisa FAPESP [1].  Vale dizer que FAPESP é uma referência de prestígio internacional e certamente não pode ser apontada como um aparelho de propaganda partidária esquerdista, petista, socialista, comunista ou @ista.

O artigo da revista está no link anexo, com todas as referências necessárias. Em geral esse tipo de leitura não é estimulante e as informações passam sem a atenção merecida. Mas, é leitura necessária para quem quiser fazer uma crítica consistente. A galera que levou o fascismo ao poder deveria ler o artigo com calma e atenção e, se não for completamente imbecil, comparar esses resultados com os discursos que tentam desqualificar os governos anteriores e com o que estão fazendo com a Educação em nosso país.  Aqui, o ministro operacionaliza o ódio a Paulo Freire [2] manifestado pelo capitão Bozo desde suas primeiras declarações, uma prática que faz da Educação uma das vítimas desse nojento preconceito social que se esconde sob o discurso babaca: “odeio o PT”.

[1]
Inclusão social no ensino superior - Revista Pesquisa FAPESP  ( Agosto de 2019) –  No. 282) – Disponível em < https://revistapesquisa.fapesp.br/2019/08/07/inclusao-social-no-ensino-superior/> - Acesso em 15/08/2019.


[2}
"Não é na resignação, mas na rebeldia em face das injustiças que nos afirmaremos." -  Paulo Freire - "PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: saberes necessários à prática educativa". 13a. edição - Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999, pág. 87


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