terça-feira, 19 de abril de 2022

Anotações político-eleitorais de abril

Opinião 

Se nada extraordinário ocorrer no processo eleitoral 2022 até lá, o Brasil elegerá um congresso majoritariamente fisiológico, com alto grau de corrupção, conservador e até reacionário em costumes.

Com grande representação dos grupos patronais e financeiros e sem qualquer compromisso com as camadas carentes da população, nem com algum projeto de desenvolvimento nacional, qualquer que ele seja, branco, banco, bala, boi e bíblia continuarão sendo as representações parlamentares principais do simulacro de democracia brasileira.

A sequência de fatos que desembocou na destituição da Dilma, a subsequente prisão de Lula, a farsa da Lava-Jato, o inchaço de militares em boquinhas na administração pública federal, as tragédias provocadas pela ocupação de importantes cargos da administração federal por militares sem a competência para tal, além das recentes e constrangedoras denúncias sobre o uso de verbas militares – tudo isso desnudou por completo os corpos políticos das forças armadas e o do poder judiciário. Exibiu a verdadeira natureza dos chamados suportes dos governos democráticos. E isso não mudará em decorrência do processo eleitoral. 

Será com essas instituições que o presidente eleito governará, seja ele Bozo ou Lula.  A essa altura do campeonato, a disputa dificilmente incluirá outra terceira via com potencial eleitoral, além das que já estão apresentadas, seja ela de centro, direita ou até de esquerda.

Há, ainda, outro elemento, o principal: a população. Esse é um sujeito poderoso e dotado potencialmente de força política quase insuperável, mas infelizmente ainda inconsciente dela e ainda muito pouco organizado. O pouco avanço de iniciativas de organização fora das tradicionais organizações sindicais e partidárias, excluindo o MST, está entre aquelas que se aglutinam em torno das chamadas pautas identitárias.

Essas organizações expressam demandas que são aderentes àquelas das populações mais necessitadas, é verdade, mas isso se dá mais por uma decorrência natural e subjetiva do que por uma iniciativa política. A nossa precariedade socioeconômica é de tal ordem que a menor movimentação em prol de melhoria nas relações sociais identifica-se obrigatoriamente com uma necessidade básica da população carente.

As organizações e movimentos identitários, em grande parte das vezes, desconsideram a natureza classista da organização social, e essa prática esconde conflitos reais advindos das diferenças de classes e que existem até mesmo dentro das próprias organizações (assunto a ser desdobrado, embora não aqui).

As pesquisas até agora apontam chances razoáveis de uma vitória do Lula, mas esse quadro deverá ser alterado significativamente, contra o Lula, com o início da campanha oficial.  Aliás, é impressionante, mas já há sinais de recuperação do Bozo, por incrível que pareça, até nas avaliações sobre a sua gestão na pandemia. A vitória do Bozo é uma possibilidade real.

Se aprovado politicamente por uma vitória eleitoral, o ex-capitão boquirroto terá o caminho livre para prosseguir em suas práticas e tentativas de destruição do país. Sua vitória escancarará o país para a barbárie e para a derrubada das poucas barreiras de proteção e obstáculos que a organização social ainda conseguiu manter mesmo durante o seu primeiro mandato.

Os seus financiadores terão a oportunidade de aparar arestas e reorganizar condições de apropriação das riquezas públicas e entrega ao capital monopolista nacional e internacional, um projeto que foi frustrado por conta da própria incompetência da figura que elegeram para representá-los.

É claro que o país não acabará por conta disso. O Brasil é uma nação rica e com muitos recursos naturais, em que pese o pauperismo da sua população. Além do mais, a própria dinâmica da política cria oportunidades inusitadas de transformações que estão além das prospectivas dos mais competentes analistas.

A oposição ao governo e regime não será tarefa fácil, até porque as principais forças políticas atuais assumidas como oposição, ao implodirem as manifestações de rua sob a palavra de ordem "Fora Bozo!" e optarem por valorizar as articulações eleitorais, abriram mão de denunciar o caráter criminoso do governo em seu primeiro mandato.  Não terão autoridade política para contestar um governo eleito num processo que elas foram as primeiras a validar.

Ainda assim, apesar da imensa frustração, muitos prosseguiremos organizando ou praticando a oposição. Mesmo os que se sentirem abatidos e caírem em desânimo participarão de alguma forma porque atualmente não há como isolar-se politicamente. A vida urbana e até a vida rural mais afastada sempre estarão em permanente contato com o cotidiano da política.

Há, também, a possibilidade do Lula ganhar e não levar. Seria uma vitória eleitoral precedida de golpe. Essa possibilidade me intriga e, embora seja uma possibilidade de grandes chances, não consigo especular com alguma clareza sobre as possíveis decorrências desse fato.

Finalmente, havendo uma vitória do Lula, qualquer que seja o mérito que se der a ela, será entendida como uma vitória de oposição que governará em condições muito adversas: sem apoio parlamentar suficiente; contrariedade das mesmas corporações econômico-financeiras que derrubaram o governo Dilma em 2016; antagonismo dos militares; o país numa enorme crise econômica, incluindo o desemprego, inflação e ascensão de movimentos grevistas; uma máquina estatal corroída e quase destruída pelo governo Bozo; uma crise internacional imprevisível que inclui até uma guerra de proporções mundiais entre suas possibilidades. Barra pesada!

Estou entre os críticos da alternativa Lula. Tomara que esteja enganado, mas acho que o PT será uma decepção para os seus próprios militantes, especialmente se o nível de confronto com a direita exigir do partido uma resposta classista. Mas, essa é uma questão para os petistas,  não me cabe desenvolve-la,  cito apenas para marcar posição. Votarei na candidata Vera Lucia do PSTU, meu partido, uma candidatura declaradamente socialista e colocada como opção de voto para os trabalhadores.

Avalio  que a vontade e empenho dos militantes petistas, além da representação simbólica do partido estão mais à esquerda do que as opções e projetos políticos dos seus dirigentes atuais, e não é por outra razão que se dá a intolerância e o ódio antipetista. O PT é a principal  força de oposição eleitoral à situação política atual e, se houver segundo turno, salvo alguma situação que esteja em contradição com os meus princípios políticos, votarei na candidatura de oposição que provavelmente será o Lula.

Assim vejo o momento atual. Mais do que nunca, estou convencido da necessidade de estarmos de olho pregado na realidade. Será ela que apontará caminhos, e o que importará serão as escolhas que fizermos. 

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