Leituras para distrair
Cocô de rato é um doce. Não faço a
menor ideia da sua composição, mas sempre tinha dele nos saquinhos de doces distribuídos nos dias 27 de setembro, dia de Cosme e Damião. Sei
que em alguns lugares e comercialmente o
nome é disfarçado como “pipocas de arroz”. Mas, nos bairros cariocas e nas
cidades adjacentes, São Gonçalo entre elas, o nome sempre foi “cocô de rato”. E
dia de Cosme e Damião era dia de ir atrás dos saquinhos de doce. Ali tá dando,
cocô de rato vai levando! Assim as crianças brincavam quando eu era uma delas. Eu
mesmo, que nunca gostei muito de doces, tive dias felizes participando das
correrias e das expectativas de ver o que havia dentro dos saquinhos.
Para mim, as lembranças infantis de
Cosme e Damião vão além das correrias atrás dos saquinhos de doces. Isso porque,
até os 9 anos, eu morava na casa da minha madrinha que, além de distribuir doces,
também promovia uma festa, talvez a mais importante do bairro. A festa atendia a
uma promessa da minha madrinha, mas outras pessoas se agregavam contribuindo de
formas diversas. O resultado era uma noite com uma rua cheia de gente que ganhava
os tradicionais saquinhos, sempre com produtos de alta qualidade, e também outros
doces e bolos servidos em pratos decorados, além de refrescos e guloseimas
diversas, como se fosse um grande aniversário.
Mas, o ponto alto da festa era um
sorteio de brinquedos. Um tio, queridíssimo, e minha tia, não menos querida, contribuíam
para a festa com uma doação generosíssima de brinquedos. Não eram brinquedos de
1,99. Eram brinquedos de qualidade e belíssimos. Jogos variados, bolas de
futebol, bonecas, um verdadeiro sonho, sem mesquinharias. Além da qualidade,
havia quantidade. No mínimo 90 unidades que eram distribuídas entre os
presentes felizardos que tivessem recebido cartões numerados. Os brinquedos eram
sorteados conforme a saída das pedras contidas em um saco de jogo de víspora.
Para nós, eu, meus irmãos e as
primas, filhas dos meus tios, o privilégio era a garantia de um cartão para
participar da brincadeira. Mas a regra vigente obrigava-nos a participar das
expectativas do sorteio e também das frustrações de não sermos contemplados com
os brinquedos desejados. Nunca soubemos de fraude para nos privilegiar nos
sorteios, nem seria necessário.
Os brinquedos ficavam guardados em um
quarto, e dias antes da festa namorávamos aqueles que gostaríamos de ganhar. Na
hora do sorteio eles eram retirados do quarto ao acaso e exibidos para excitar a
molecada animando a festa. Uma pedra numerada era retirada do saco e o
brinquedo entregue a quem tivesse o cartão correspondente. Uma felicidade
total! Acho que viver aqueles momentos era a grande recompensa desejada pelo do
meu tio falecido prematuramente.
Aquela festa seria impossível nos
dias de hoje. Difícil até de imaginar, mas nunca houve confusão além da normal
e decorrente da grande quantidade de pessoas. Na verdade era um tempo de menos miséria
nos arredores. Havia a possibilidade de curtir alegria e felicidade entre
vizinhos e até entre estranhos, além do restrito grupo familiar. Foi um tempo bom, sem dúvida.
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