Opinião
Estou entre
os emocionalmente abalados com essa crise do coronavirus. Mas, não desesperado.
Qualquer sentimento de autocomiseração é logo afastado quando levanto o olhar
do umbigo e me dou conta dos tantos que não têm o mínimo de suporte e condições
para atravessar essa crise. Ainda assim, vendo os prognósticos de alguns
especialistas sobre as possíveis decorrências dessa situação, mesmo as
otimistas, isento de alarmismos e de supervalorização do caos, sinto-me triste.
Minhas
angústias não passam pelo risco, no meu caso relativamente grande devido à
idade, de uma eventual contaminação. Pretendo ainda viver mais um tanto, mas me
considero no lucro em termos de longevidade. Uma premissa que me permite encarar
e tratar o risco com naturalidade, sem negar o cagaço nem a insegurança.
Contudo, penso
nas outras gerações e, sem falso altruísmo, penso nos mais próximos. Meus
netinhos também estão vivenciando o
afastamento social. Protegidos na medida do possível, mas sem fazer ideia do
que está ocorrendo, em que pese as proteções que privilegiadamente eles podem
desfrutar, não compreendem porque, de uma hora para outra, foram levados a um
confinamento domiciliar e apartados do mundo que para eles não tinha limites.
Alguns
especialistas alertam que não voltaremos à sociedade que deixamos antes do
isolamento. Compreendo essa avaliação, mas não penso nela como inusitada. Afinal, “ninguém pode
entrar duas vezes no mesmo rio” – reflexão heraclitiana acertada
e elaborada desde 500 A.C. Tudo flui, e assim como a sociedade pós-isolamento será
outra, os meus pequeninos também já não serão os mesmos pequeninos. Mas, o vovô
aqui gostaria que essa nova sociedade não fosse determinantemente distópica.
Mas, uma sociedade com um mínimo de oportunidades para que eles possam projetar
os seus sonhos e viverem os seus momentos de felicidade enquanto tentam
construir o melhor para suas vidas.
No mais, sigo
puto da vida, submetendo-me ao necessário afastamento provocado por esse sacana
desse bichinho que não mede mais do que 0,0000001 metros. Controlo minhas
vontades, meus desejos. Abraçar, beijar, cafungar e cheirar meus netinhos. Sempre
fiz esse exercício de tentar deixá-los impregnados com a lembrança do meu
cheiro (bom ou mau). Uma lembrança inconsciente porque aquelas conscientes
serão naturalmente esquecidas com tempo.
Será
pensando naqueles pequerruchos e em nome
de um futuro desejado melhor para eles que mais tarde cumprirei uma obrigação.
Irei pra janela me manifestar contra esse grupo de filhos das putas que louvam os
torturadores e assassinos que praticaram o golpe civil-militar de 31 de março
de 1964 implantando uma ditadura em nosso país. Não passarão!
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