segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Vamu nessa!


Opinião


Os chilenos voltaram às ruas no dia 13 de dezembro, o dia em que foi divulgado o  relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre violência e violações aos direitos humanos por parte da polícia durante as manifestações recente. Emocionante! Vejam o link abaixo.

Aqui, muitos de nós indagamos sobre a tolerância da nossa população e quando daremos um basta, saindo para o enfrentamento contra esse sistema escroto que nos submete.

Porém, tanto essa visão de tolerância como essa dúvida são INCORRETAS. A questão que precisamos tratar é: QUANDO OUTROS DE NÓS ESTAREMOS AO LADO E REFORÇANDO OS QUADROS DAQUELES QUE JÁ ESTÃO REALIZANDO ESSE ENFRENTAMENTO.

A luta já está nas ruas. Ela tem sido o cotidiano de índios, negros, pobres, marginalizados e discriminados sociais de toda ordem, inclusive por opções de atitudes de vida e até por opções religiosas.

Esses grupos já estão enfrentando tentativas de dizimá-los, de abatê-los. Estão sendo assassinados pelos braços armados do estado que antes eram tipicamente institucionais e agora reforçados por mercenários. Milicianos nos centros urbanos, jagunços nas regiões rurais.

A luta já está nas ruas. O que precisamos é aderir.

Evento Praça da Dignidade - Chile - em 13/12/2019 - Acesso em 16/12/2019 




domingo, 1 de dezembro de 2019

Tá com medo tabaréu?

Leituras para distrair


Talvez por conta da idade, as memórias recentes  perdem prioridade, como se não encontrassem um alojamento. As vagas estão tomadas por outras de tempos distantes. Indício de Alzheimer? Não importa, esquecerei também! O fato é que as lembranças mais antigas povoam o meu cérebro de uma forma até implicante.

Vi um menino empinando uma pipa na praia. O moleque corria pra lá e pra cá num movimento repetido por milhões de crianças em todo o mundo. Lembrei que, a rigor, nunca “empinei pipa”. Tive familiares que moravam em subúrbio da cidade do Rio de Janeiro e que empinavam pipas. Mas, lá em São Gonçalo, outro lado da poça, a molecada  “soltava cafifa”.

Empinar pipa e soltar cafifa eram exatamente a mesma brincadeira, mas as designações e  tipos de cafifas ou de pipas eram distintos. Cafifa e pipa eram designações genéricas, em São Gonçalo e no Rio. Porém, cafifas não usavam as “rabiolas” um complemento fundamental nas pipas cariocas. Arraias, piões, morcegos e marias-largas eram tipos específicos de cafifas.  Distinguiam-se pelos formatos das armações de bambu. Nenhuma delas com rabiolas. Entre as pipas cariocas havia os morceguinhos, piões e outros tipos que eu nunca soube, não era minha praia. Invariavelmente, todas com rabiolas enormes.

As cafifas e as pipas que falo nada tinham a ver com as peças que hoje frequentam os campeonatos de pipas. Por mais lindas que sejam, e apesar de carregarem consigo a experiência e a prática popular, não eram essas pipas de campeonato que povoavam os céus em nossa infância. Sem desfazer da qualidade técnica de suas construções , nem da beleza e encantamento que lhes são peculiares, as atuais pipas de campeonato não representam a memória das nossas brincadeiras infantis, aqui, no estado do Rio de Janeiro. As atuais pipas de campeonato parecem representar uma história recente de cópia e assimilação de práticas estrangeiras.  

No alto, as cafifas eram presas e controladas por linhas de algodão esticadas e embebidas em uma mistura de cola de madeira e vidro moído que chamávamos de “cerol”. Com as pipas também era assim,  mas a mesma mistura era chamada de “cortante”. Através de manobras que faziam as linhas deslizarem uma sobre a outra, era possível cortar uma delas conforme a eficiência do cerol ou cortante. Entre as cafifas essa disputa era chamada de “torar”. Entre as pipas o termo mais comum era “cruzar”.

Interessante é que, em linha reta,  as populações de moleques não se distanciavam mais que 50 quilômetros. Porém, os vocabulários eram distintos, embora atualmente se confundam. Eles identificavam territórios, as nossas origens. Possivelmente alguém nessa web que é a enciclopédia do mundo terá registrado as correspondências. Eu só guardei algumas.

Quando uma linha esticada no alto precisava ser alcançada, amarrávamos duas pedras em cada ponta de um pedaço de outra linha, imitando uma boleadeira gaúcha, e jogávamos para fazer a linha esticada descer. A nossa boleadeira tinha o nome de “landrola” e a mesma peça era chamada pelos moleques cariocas de “marimba”.

Após passar o cerol (essa expressão hoje tem um significado macabro) na linha esticada, para tirar os excessos acumulados tensionávamos a linha brevemente, como se faz ao tocar uma corda de violão. Essa ação era chamada de “estancar”. A linha esticada se prendia à cafifa através de um pedaço também de linha chamado “cabresto”, e quando numa tora entre duas cafifas o corte se dava bem longe do cabresto causando a perda de uma grande quantidade linha, que ia junto a cafifa torada, a garotada dizia que a cafifa foi torada “na mão”.

Sem rabiolas era muito difícil capturar uma cafifa torada ainda solta no ar. Mas, havia os virtuoses que conseguiam realizar essa façanha que se chamava “aparar”. Cortei e aparei! Gabava-se o triunfante do embate.

Esse tal alemão que apavora as velhices poderá até me deixar bastante confuso, mas não vai me tirar essas lembranças, jamais. Fecho os olhos e “dou linha” no carretel do tempo.
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