Leituras para distrair
Santo Antonio, São João e São Pedro são as três
referências de festas juninas, mas para mim e outros próximos, na juventude, o ciclo encerrava com a celebração de Santana.
Reverenciada em 26 de julho, a avó do Cristo era a patrona de uma festa que se
realizava em Monjolos, um bairro de São Gonçalo – RJ que, naquela época, era afastado
dos centros urbanos da cidade.
A festa de Munjolos (o nome correto do distrito é
Monjolos, mas ninguém pronunciava assim) sempre era programada para a última
semana ou último fim de semana do mês de julho. Não sei como é hoje, mas para
nós, nos anos 60 do século 20, era o
gran finale dos festejos juninos.
Frequentei a festa desde menino, levado por um colega que
se tornou o meu grande amigo, parceiro e compadre. Companheiro de
histórias que não cabem aqui, infelizmente
falecido. A família do meu compadre era oriunda da região. Família grande, eram
proprietários e herdeiros de vários sítios que em outros tempos constituíam laranjais,
uma cultura natural naquela parte do RJ, limite com o município de Itaboraí.
Um comentário de passagem: o extrativismo de laranja na
região foi predatório. Sem projetos de agricultura permanente e renovada, esgotadas
as capacidades de produção das terras, os
laranjais foram transformados em loteamentos pelas últimas gerações de
proprietários.
O pai do meu compadre, que também foi outro inesquecível
e querido amigo, serviu como combatente da FEB na Itália, e a família comprometeu-se
com a construção de uma igreja no bairro como contrapartida pelo seu
retorno que foi visto como uma graça
religiosa. Isso motivou atividades para angariar fundos e tocar a construção da
capela que se situava na pracinha central do bairro. As festas anuais eram umas
dessas atividades.
Munjolos não era mais do que a pequena praça com um
coreto e a igreja. Um pouco distante da praça, talvez um quilômetro, havia outro
núcleo devido a um campo de futebol e barracas que atendiam à galera nos dias
de jogos.
No entorno da
praça da igreja havia um pequeno comercio: armazém, padaria, armarinho,
barbearia, farmácia , uns botecos etc. No mais, eram residências, e as casas
que não eram de familiares do meu compadre eram de conhecidos e vizinhos de relações muito próximas.
A festa tinha procissão e missa. Tinha os que caminhavam
ao lado da santa; tinha os que ficavam mais próximos do padre; tinha a turma
que carregava o andor com a imagem; os grupos de tradicionais carolas entre
outros. Enfim, havia um ritual que atendia às relações sociais locais.
O amanhecer era marcado por salvas de fogos de
artifícios: foguetes e fura-balões – começava a festa. A agitação das montagens
das barracas já iniciadas na semana anterior compunham o clima de festa.
As barracas eram típicas de festas juninas: jogos, doces,
salgados, bebidas. A “Barraca da Santa” era uma especial. Em local privilegiado
e pré-estabelecido, a arrecadação com a venda dos seus produtos, contribuições
da comunidade, era revertida para o projeto da igreja.
Em algum momento da noite ocorria o ponto alto da festa –
um leilão. Era o quando os
representantes dos poderes locais, geralmente aglutinados em torno da Barraca
da Santa, faziam as suas doações e exercitavam as suas relações arrematando as
prendas leiloadas e, às vezes, devolvendo para que fossem leiloadas outra vez.
As prendas muito valorizadas eram os leitões e cabritos assados. Até onde
lembro, o leilão era a atividade que demarcava o encerramento oficial da festa
que, na prática, prosseguia até o início da madrugada.
O dia se construía em torno dessas atividades. Para mim era
um clima gostoso que foi assumindo aspectos diversos na medida em que as nossas vidas também
mudavam. Conversas, brincadeiras, paqueras, encontros, novas relações, aprendizados,
frustrações e alegrias marcaram uma época importante para alguns de nós. Cada
uma dessas emoções foi vivida como experiências distintas num período que foi
desde que éramos ainda crianças até uma idade onde alguns já éramos casados e
até com filhos.
Na festa tinha o churrasquinho de gato do Galdino –
inesquecível para mim. Era o ambulante mais simples de todos. Um pequeno
fogareiro e os espetinhos. Galdino servia os espetinhos de carne cuja origem
era mote das conversas, mas cujo aroma era sedutor. Era inconcebível passar a
festa sem consumir pelo menos um daqueles churrasquinhos.
As ilações sobre a origem do churrasco do Galdino eram
justificadas porque o consumo de caça era comum naquela época e região, e o
gato não era considerado uma “vaca sagrada”. O Zé Magro, caseiro de um dos
sítios, alimentava-se exclusivamente dos animais que caçava.
A casa dos avós paternos do meu compadre era a nossa
base. De lá saímos muitas vezes para dias e momentos felizes dos quais ficaram
generosas lembranças de fatos e personagens. Salvo uma ou outra encrenca, sem
consequências, o ambiente era tranquilo e sem violências. Naturalmente isso
mudou e acabou.
Nunca mais voltei. Suponho que o Munjolos de minhas
lembranças deixou de existir. Nem mesmo sei qual o nome oficial da igreja. Não
pesquisei. A rua lateral à igreja, onde fazíamos a nossa base, hoje tem o nome
do pai do meu compadre: Rua Expedicionário Jaime Porto – Monjolos – São Gonçalo
– RJ.
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A melhor imagem que consegui (via web). A igreja e o coreto da pracinha - copiei em 27/06/2021
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