domingo, 20 de junho de 2021

Aniversário do Hercílio

Leituras para distrair

Nas religiões de origem africanas, e também em outras que nem sei exemplificar, há um ritual comum: o banho de descarrego.

 Com  águas puras ou misturadas com sais ou ervas, o banho de descarrego é um ritual que limpa. Descarrega as chamadas “energias” negativas do indivíduo. Limpa o sujeito. Prepara-o para novas adversidades.

 Em minha casa, na infância, ele era feito em uma bacia. Sem compreender direito o que estava ocorrendo, em pé, na bacia, pelados, éramos banhados com uma cuia utilizada para despejar sobre nós a água  que escorria na própria bacia.

 O banho de descarrego não é uma novidade nas praticas religiosas, cada uma delas, ao seu modo e com suas peculiaridades, tem o seu banho. Na macumba (muitos religiosos umbandistas e similares não gostam que se refira à religião por esse termo) é assim. O banho descarrega e alivia. Daí o seu nome.

 Os maravilhosos sambistas  Arlindo Cruz, Sombrinha e Sereno compuseram um hino que diz assim:

 Vovó Maria me ensinou que é muito bom, muito legal tomar um banho de ervas, tomar um banho de sal. Uns tomam banho de lua, uns tomam banho de sol, uns tomam banho de chuva, lá no no fundo do quintal ... Mas pra se ter a certeza que banho só traz axé, seja banho de cheiro, banho de arruda, banho de guiné ... o mais importante é a fé. Se você é de rodar ou se é de bater tambor, faça o favor, tome um banho de Abo.  

 Na língua yorubá, o banho de ervas é um banho de Abo.

 Foi a sensação que tive hoje, 19/06/2021, após a manifestação contra o Bozo genocida. Um banho de Abo. No último dia 29 de maio  eu estava prejudicado. A porra da Covid me pegou no dia 27, mesmo protegido (suponho) pelas duas doses de coronavacs que já havia tomado, e não pude comparecer. Mas, hoje eu fui. Que coisa boa!

 Concentrei no monumento Zumbi,  "fim" da passeata que descia a Presidente  Vargas desde a Praça Onze  até não sei onde. Talvez Candelária. Quando caminhei, antes da passeata iniciar,  já tinha gente até a altura do Campo de Santana. A passeata saiu às 12 horas e ainda estava chegando gente.

 Eu dispersei na altura da Uruguaiana - não sei dizer sobre o movimento dali para frente. Vi poucos velhinhos. Muitos jovens, não necessariamente garotos. Entre 30 e 40 anos. Foi um banho que lavou um pouco a alma. Impressionante como a máquina reclama. Estou bem acostumado a caminhar e ainda assim achei cansativa. Melhor idade é o caralho! Velhice é foda! Segui ao lado da galera do PSTU e configurei-me no modo COVID: junto sem estar misturado.

 Ainda trouxe para casa raiva e ódio por esse governo escroto, mas os penduricalhos, aqueles que nos  fazem mal e trazem tristeza e depressão ficaram por lá. Junto com aquela meninada que sassaricava e batia tambores. Que apostava a vida naquela mobilização.

 Que bom que me transformei nessa coisa, nesse militante inconformado. Tomara que eu continue assim. Hoje, estranhamente, sou mais emotivo. As tantas passeatas, caminhadas e agitações que participei não me fizeram indiferente, tipo: de já vu. Acho bom que seja assim.

 Uma moleca em pernas de pau, ao meu lado, consegue fazer trejeitos que eu não faria nem se assistido por um treinador pessoal. Precisamos de outras manifestações como essa. O Bozo e seus seguidores cairão se forem derrotados nas ruas. Não chorei, mas a voz embargou quando ouvi as repetidissimas palavras de ordem. A máscara permitiu confortavelmente os disfarces.

 Fora Bozo! Fora filho da puta! Não importa se “... _você é de angola é de ketu ou de nagô. Faça o favor, tome um banho de Abô_...” Faremos um mundo melhor.

 Foi um bom jeito de celebrar o aniversário do meu companheiro Hercílio que vive lá em Recife.

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