domingo, 11 de novembro de 2018

Conversas para um terceiro turno - Parte 2 de 3


Opinião

Esses registros não são conclusivos nem completos. São uma tentativa de organizar reflexões sobre possíveis ações e posicionamentos a propósito de alguns tópicos que estão na pauta política.
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Parte 2/3 - Como atuar nesse cenário? (Tempo estimado de leitura 5 minutos)

Um ponto importante em relação à nossa forma de atuação deve ser o ajuste das nossas expectativas. Não há fato que indique a possibilidade de uma reversão brusca do quadro político (pelo menos, até agora). Ainda estamos no período de outorga do poder resultante das urnas. A partir da posse, em janeiro 2019, o governo eleito terá acesso pleno aos instrumentos de poder. O novo governo representa um poderoso sistema político que tem entre os seus objetivos eliminar as representações de esquerda em nosso país. Isso foi dito e repetido ao longo da campanha. Então, o correto é supor que ele atuará com toda a força e competência, que já demonstrou ter, para excluir qualquer possibilidade de oposição. Essa expectativa  não quer dizer que devemos aceitar o fato como um vaticínio divino. Ao contrário, nossa ação deverá ser enfrentar e revidar, além de promover as atividades que façam avançar o projeto de sociedade que queremos. Mas, sem desespero nem fantasias. Com uma visão clara sobre o que está ocorrendo.

Outra ação importante e necessária de realizar será a manutenção do volume da oposição. O resultado eleitoral apontou uma diferença percentual de 10,3% que corresponde a cerca de 10,7 milhões de votos. Considerando os interesses que representa e com o seu perfil, o novo governo deverá cagar e andar para as proporções do resultado. Mas, não desistirá desse alvo, dessa massa de eleitores que declarou explicitamente o voto contra ele. Será um equívoco tratar esses eleitores como uma massa atrelada por um cabresto de oposição. Mesmo ela estará em disputa e precisará ser mantida como aliada. Ela é a base de qualquer esperança de transformação. Não fará sentido  tentar angariar novos opositores sem a preocupação de manter e consolidar a base de oposição identificada no processo eleitoral.

A tarefa mais difícil: aumentar o volume de opositores sem esperar ou torcer pelo pior. Sair das bolhas. Tentar conversar com pessoas que endossaram a proposta fascista. Aturar e superar argumentos que já contestamos.  Mas,  há uma diferença que pode ser positiva. Antes, as discussões incluíam a disputa de candidaturas que em muitos casos prejudicava as discussões. A tarefa agora é promover o debate de teses, propostas e projetos tentando identificar potenciais adeptos e distingui-los dos fascistas ideológicos.

É preciso construir aquilo que os  partidos não lograram construir. Um engajamento de oposição com visão crítica e ciente dos sujeitos políticos e dos seus interesses. Esse trabalho precisa ser permanente. No período eleitoral, que é curto e determinado, é válida a interpretação do “voto  conquistado”, mas no cotidiano social isso é um erro. O governo eleito utilizará os recursos que já utilizou durante a campanha eleitoral  e, ademais, contará  com os instrumentos de poder para a propaganda das suas teses. Vizinhos, familiares, colegas de trabalho, conhecidos comuns. Nas campanhas tentamos identificar esses grupos para ganhar votos. Agora e em todo o período que vem pela frente precisamos formar grupos e promover discussões sobre os principais temas políticos. Se não fizermos isso ficaremos isolados, e até mesmo alguns poderão ser cooptados pela propaganda da situação.

Pensar. Refletir. Elaborar. Revisar. Traduzir. Interpretar. Argumentar. Contrapor. Mais do que nunca. Orientar o eixo dos debates para os temas políticos e para  as propostas e ações que valorizamos. Qualificar o governo eleito a partir de suas ações. As adjetivações do tipo bom, honesto, mau ou corrupto podem estar corretas, mas são reduções que não deixam espaço para conversas e que despertam as rejeições que favoreceram os votos na direita. Não nos cabe fazer alardes precipitados diante do anúncio de algumas nomeações de composição do governo. Não temos qualquer poder de veto ao projeto fascista. Ele  governará com os seus quadros. O real significado das suas nomeações tem sido desvelado, até mesmo na imprensa internacional. Não precisamos fazê-lo. A gritaria precipitada só servirá como filtro e soará como um alerta para o governo aprimorar as suas escolhas, mas sem mudar o seu projeto. Além disso, conforme a gritaria, o passo seguinte poderá ser a cobrança de nosso compromisso com uma nova indicação. Uma armadilha. Agindo assim, seremos os idiotas úteis. [4] [5]

Uma atuação mais engajada deverá ser feita a partir do movimento organizado nas diversas dimensões, especialmente os partidos e os sindicatos. Caberá ao movimento organizado empenhar-se para que ocorra a ocupação dos espaços e o debate público das questões que devem ser trazidas para as ruas. Será preciso que estejam dispostos a isso e não se percam no conforto das negociações de gabinetes, com ar condicionado e cafezinhos. A palavra de ordem “ele não” foi derrotada nas urnas, isso é um dado da realidade. Então, o que precisamos promover como objetos da mobilização social são as nossas propostas, as nossas críticas e as contradições do governo – que certamente serão muitas. A rejeição ao governo eleito virá como consequência. A nossa tarefa é fortalecer esse movimento, essa dinâmica  para dias que imaginamos estejam por vir. É assim que nos cabe contribuir. Haverá também uma dinâmica dos dias reais, mas essa será promovida pelas ruas, como tem sido historicamente.

Referências
[4]
“Jair Bolsonaro promises senior job to judge who jailed his rival (Jair Bolsonaro promete emprego a juiz que prendeu seu rival” – Manchete do The Sunday Times  (Times)  replicada em importantes jornais do mundo inteiro desvela aspectos do governo eleito. No caso, a recompensa recebida pelo juiz  que chutou o pau da barraca para garantir a prisão de Lula. Disponível em <https://www.thetimes.co.uk/article/jair-bolsonaro-promises-senior-job-to-judge-who-jailed-his-rival-5zc26t7p8> Acessado em 11/11/2018

[5]
 “Até os mitos desiludem “ – Observações em coluna de Luis Fernado Verissimo em jornal O Globo sobre “recompensa (se não é, parece) por ter despachado o Lula para a cadeia ligeirinho e publicado a delação do Palocci contra o Lula dias antes da eleição” – Disponível em < https://oglobo.globo.com/opiniao/desilusoes-23218971#ixzz5WHgMHAVb> - Acessado em 11/11/2018.




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