Leituras para distrair
No modo de produção capitalista, o trabalhador não vende o
seu trabalho. Ele vende a sua força de trabalho por um salário e por uma
jornada acertada entre as partes, e o comprador, o patrão, se apropria da
mercadoria que a força de trabalho produzir durante o tempo a que tem direito.
Essa relação salário x força de trabalho que é legalmente aceita, faz parecer que o
salário representa uma troca de dinheiro
por trabalho quando não é isso que ocorre, isso é uma ilusão.
Não se trata de uma compra do “trabalho” em troca de salário,
mas a compra do direito de uso da “força de trabalho” por um determinado tempo,
uma jornada. Cotidianamente tratamos o salário como se fosse o pagamento do
trabalho quando o salário é o preço da venda da força de trabalho. Trabalho
e força de trabalho são coisas distintas.
O capitalista, patrão, comprador da força de trabalho, pode
também comprar diversas outras mercadorias e armazena-las (materiais,
ferramentas, máquinas, instalações etc.). Não faria sentido, mas deixadas por
si, elas ficarão alocadas onde estiverem e do jeito que estiverem, pelo tempo
que forem deixadas lá, e sujeitas ao desgaste natural dos materiais de sua
composição.
Podem até serem valorizadas no mercado de trocas se houver
escassez de algumas, mas a tendência e
probabilidade maior é o desgaste e desvalorização. Elas não produzirão nenhum
outro valor.
Contudo, se o tal comprador, capitalista, reunir certas
mercadorias com a mercadoria força de trabalho que ele também tenha comprado,
outras mercadorias poderão ser produzidas, e o capitalista poderá levar essas
novas mercadorias ao mercado de trocas para vende-las.
A nova mercadoria, produto do uso da força de trabalho, é
trocada ou vendida a por um preço maior – geralmente bem maior - do que aquele
que o trabalhador recebeu pela venda do uso de sua força de trabalho (esse é o
objetivo).
O capitalista então faz a compensação de todos os seus
gastos, incluindo os salários que pagou, e se apropria do excedente chamando-o
“lucro” que ele sempre buscará aumentar (a rigor, a busca do capital é sempre
maximizar uma relação chamada “taxa de lucro”).
A criação de uma nova mercadoria que pode ser vendida por
valor maior que o empenhado pelo capitalista na aquisição de meios de produção
e de força de trabalho, só é possível pela característica especial da força de
trabalho. Só ela – a força de trabalho - é capaz de fazer um novo valor
acontecer.
Contudo, esse
mecanismo não é tão evidente. Geralmente, nem o próprio trabalhador ao se deparar
com a mercadoria que produziu reconhece nela o seu trabalho. E essa alienação é
tão significativa que, em geral, olhamos em volta para as coisas do mundo sem
refletir que cada uma delas, sem exceção, salvo os elementos da natureza, só
existe porque há na sua composição o trabalho humano, o produto da força de
trabalho de alguém ou de muitos.
Essa distância, essa alienação, entre o trabalhador e o produto da sua força
de trabalho, ou seja, o seu trabalho efetivado, passa a impressão que o mundo
material existiria sem o esforço do trabalho humano. E uma impressão que,
apesar de falsa, é cada vez mais forte nesses tempos de internet, redes
sociais, plataformas de trabalho e inteligência artificial.
O programa computacional mais bem elaborado, a máquina mais
sofisticada e inteligente ou a cachaça mais saborosa não existiriam sem a força
de trabalho humano.
Essa ilusão ignorante interessa a um dos lados da luta de
classes: o capital. A aparência que o lucro surge por si só, do nada, com vida
própria, como um parto virginal, sem cópula, é conveniente na medida em que
esconde o mecanismo de exploração da força de trabalho.
Sob outro olhar (o “nosso”), na medida em que o trabalhador
nada recebe desse excedente que só a sua força de trabalho é capaz de produzir
e produziu, aquilo que o capitalista
chama de lucro, trata-se de fato de um mecanismo de exploração. É a parte do
produto do seu trabalho que o trabalhador não recebe, embora, vale insistir, ele
tenha negociado legalmente a venda da sua força de trabalho ao preço de um
salário.
Na história da economia (economia capitalista seria um
pleonasmo), até hoje, há mais de 150 anos, apesar das várias tentativas, nenhum
teórico conseguiu apresentar outra justificativa para a origem do lucro.
Karl Marx, que dedicou parte significativa de sua vida ao
estudo dessas relações, desvelou esse mistério, tão conveniente para os
capitalistas, e registrou seus estudos e anotações que se desdobraram em 3
volumes sob o título geral “O Capital - Crítica da Economia Política”.
Não é por outro motivo que os economistas clássicos odeiam o velho
Mouro e tentam disfarçar suas formulações e excluir suas análises e
conclusões, embora nunca tenham conseguido.
A pergunta “de onde vem o lucro?” deixa economistas e
capitalistas apavorados. Por isso, fogem do Mouro como o diabo da cruz. ###