segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Organização e Mobilização dos Trabalhadores

 Leituras para distrair

Em muitas e significativas áreas, a situação atual da organização da produção traz novas dificuldades e oportunidades para a organização dos trabalhadores. A comunicação com a classe e entre a classe é facilitada, mas ela também é disputada por fontes diversas com diversidades de informações.

As facilidades de comunicação e a pluralidade de informações, características de nossos dias, não levam necessariamente a uma relação grupal. Esse é um fenômeno constatado pelos analistas sociais. Ao contrário, verifica-se hoje um fenômeno de isolamento do indivíduo diante do mundo de contatos e oportunidades potenciais.

Quando os sindicatos, que ainda são os agentes que promovem a organização dos trabalhadores, não se impõem nessa disputa de comunicação, a tendência é o trabalhador perder a consciência da sua posição de classe. Ele nem mesmo sabe o que isso significa.

O trabalhador não fica imobilizado. Ele precisa sobreviver. Então, ele busca  caminhos alternativos e disponíveis para resolver suas dificuldades, ainda que nem sempre escolha a melhor opção.

Esteja ele em sua casa, ou na sua sala, na sua “estação de trabalho”, ou na sua bicicleta, moto ou automóvel prestando o seu serviço, o trabalhador se vê sozinho. E um aspecto fundamental da sua organização como classe – a solidariedade – vai para o caralho!

Não há mais colegas de trabalho. Nem de empresa, nem de sala. Nem de prédio, nem de nada. Sozinho, seja qual for o seu local de trabalho, o sujeito, de qualquer gênero, tem que pensar alternativas para suas necessidades que geralmente não são apenas dele, mas de uma família sob sua responsabilidade.

O trabalhador, ele ou ela, precisa elaborar por si mesmo respostas de classe que estariam no seu repertório de alternativas se ele convivesse com companheiros que experimentam as mesmas necessidades, e se tivesse a oportunidade de saber sobre as respostas que foram dadas por outros trabalhadores que historicamente passaram por experiências similares. É como se o trabalhador tivesse que reinventar a roda.

Infelizmente, alguns acham que estão superando essas limitações. Acham que não só venceram, mas mudaram de classe. Tornaram-se empreendedores. O capital, objetivado na figura do capitalista, do patrão, para quem o estágio atual da organização da produção sorri favoravelmente, estimula essa ilusão do trabalhador, ao mesmo tempo em que retira os seus direitos trabalhistas.

Afinal, diz o patrão, agora corremos juntos! Já não tenho a obrigação com férias, carteira de trabalho, décimo terceiro salário, auxílios de saúde, de alimentação ou fundos de aposentadoria! Somos até concorrentes, vivemos as mesmas dificuldades! E muitos trabalhadores passam recibo de babacas acreditando nessa história.

Mas, o canto de sereia do capital não seduz apenas os trabalhadores. São muitos os dirigentes sindicais que por ignorância do contexto, por incompreensão do seu papel ou até por malícia, por peleguismos puro, acomodam-se na ideia de que não há o que fazer, em vez de avançarem nas tentativas de entendimento da situação e na busca de possibilidades de superar as dificuldades. Esse é o retrato de parte significativa da atual crise sindical.

Nos centros urbanos, nas grandes empresas e fábricas que permanecem como os pontos focais de organização dos trabalhadores,  já não existem as grandes movimentações de entrada e saída de seus expedientes ou nos seus intervalos refeições.

Deixaram de existir os pátios de concentração, e a própria presença no local está rareada com a possibilidade do home office. Mas, isso não quer dizer que os trabalhadores tenham desaparecido ou que deixaram de se constituir como classe. Há, sim, uma mudança na organização da produção que impõe mudanças nos mecanismos de organização dos trabalhadores, mas o mundo ainda é o resultado da força de trabalho.

Para reunir essa força não há receita de bolo, não tem mágica, e nunca teve. O capital mudou a forma de fazer valer sua ideologia, temos a responsabilidade de encontrar a nossa.

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domingo, 8 de dezembro de 2024

Força de Trabalho, Exploração e Lucro

Leituras para distrair

No modo de produção capitalista, o trabalhador não vende o seu trabalho. Ele vende a sua força de trabalho por um salário e por uma jornada acertada entre as partes, e o comprador, o patrão, se apropria da mercadoria que a força de trabalho produzir durante o tempo a que tem direito.

Essa relação salário x força de trabalho  que é legalmente aceita, faz parecer que o salário representa uma troca  de dinheiro por trabalho quando não é isso que ocorre, isso é uma ilusão.

Não se trata de uma compra do “trabalho” em troca de salário, mas a compra do direito de uso da “força de trabalho” por um determinado tempo, uma jornada. Cotidianamente tratamos o salário como se fosse o pagamento do trabalho quando o salário é o preço da venda da força de trabalho. Trabalho e força de trabalho são coisas distintas.

O capitalista, patrão, comprador da força de trabalho, pode também comprar diversas outras mercadorias e armazena-las (materiais, ferramentas, máquinas, instalações etc.). Não faria sentido, mas deixadas por si, elas ficarão alocadas onde estiverem e do jeito que estiverem, pelo tempo que forem deixadas lá, e sujeitas ao desgaste natural dos materiais de sua composição.

Podem até serem valorizadas no mercado de trocas se houver escassez de algumas,  mas a tendência e probabilidade maior é o desgaste e desvalorização. Elas não produzirão nenhum outro valor.

Contudo, se o tal comprador, capitalista, reunir certas mercadorias com a mercadoria força de trabalho que ele também tenha comprado, outras mercadorias poderão ser produzidas, e o capitalista poderá levar essas novas mercadorias ao mercado de trocas para vende-las.

A nova mercadoria, produto do uso da força de trabalho, é trocada ou vendida a por um preço maior – geralmente bem maior - do que aquele que o trabalhador recebeu pela venda do uso de sua força de trabalho (esse é o objetivo).

O capitalista então faz a compensação de todos os seus gastos, incluindo os salários que pagou, e se apropria do excedente chamando-o “lucro” que ele sempre buscará aumentar (a rigor, a busca do capital é sempre maximizar uma relação chamada “taxa de lucro”).

A criação de uma nova mercadoria que pode ser vendida por valor maior que o empenhado pelo capitalista na aquisição de meios de produção e de força de trabalho, só é possível pela característica especial da força de trabalho. Só ela – a força de trabalho - é capaz de fazer um novo valor acontecer.

Contudo,  esse mecanismo não é tão evidente. Geralmente, nem o próprio trabalhador ao se deparar com a mercadoria que produziu reconhece nela o seu trabalho. E essa alienação é tão significativa que, em geral, olhamos em volta para as coisas do mundo sem refletir que cada uma delas, sem exceção, salvo os elementos da natureza, só existe porque há na sua composição o trabalho humano, o produto da força de trabalho de alguém ou de muitos.

Essa distância, essa alienação,  entre o trabalhador e o produto da sua força de trabalho, ou seja, o seu trabalho efetivado, passa a impressão que o mundo material existiria sem o esforço do trabalho humano. E uma impressão que, apesar de falsa, é cada vez mais forte nesses tempos de internet, redes sociais, plataformas de trabalho e inteligência artificial.

O programa computacional mais bem elaborado, a máquina mais sofisticada e inteligente ou a cachaça mais saborosa não existiriam sem a força de trabalho humano.

Essa ilusão ignorante interessa a um dos lados da luta de classes: o capital. A aparência que o lucro surge por si só, do nada, com vida própria, como um parto virginal, sem cópula, é conveniente na medida em que esconde o mecanismo de exploração da força de trabalho.

Sob outro olhar (o “nosso”), na medida em que o trabalhador nada recebe desse excedente que só a sua força de trabalho é capaz de produzir e produziu, aquilo  que o capitalista chama de lucro, trata-se de fato de um mecanismo de exploração. É a parte do produto do seu trabalho que o trabalhador não recebe, embora, vale insistir, ele tenha negociado legalmente a venda da sua força de trabalho ao preço de um salário.

Na história da economia (economia capitalista seria um pleonasmo), até hoje, há mais de 150 anos, apesar das várias tentativas, nenhum teórico conseguiu apresentar outra justificativa para a origem do lucro.

Karl Marx, que dedicou parte significativa de sua vida ao estudo dessas relações, desvelou esse mistério, tão conveniente para os capitalistas, e registrou seus estudos e anotações que se desdobraram em 3 volumes sob o título geral “O Capital - Crítica da Economia Política”.

Não é por outro motivo que os economistas clássicos odeiam o velho Mouro e tentam disfarçar suas formulações e excluir suas análises e conclusões, embora nunca tenham conseguido.

A pergunta “de onde vem o lucro?” deixa economistas e capitalistas apavorados. Por isso, fogem do Mouro como o diabo da cruz. ### 

sábado, 7 de dezembro de 2024

Classe e luta de classes

 Leituras para distrair

O que caracteriza a classe no capitalismo não é o fato de se trabalhar num mesmo prédio, numa mesma empresa, ter um mesmo patrão, realizar a mesma atividade, nem mesmo a grana que se recebe como salário.

O pertencimento de classe é determinado pelo papel do indivíduo no modo de produção vigente. Quem vende a sua força de trabalho como a única mercadoria que possui para levar ao mercado de trocas e poder sustentar suas necessidades pertence a classe chamada trabalhadora que, em outras épocas, foi chamada de proletariado.

Quem compra o direito de uso dessa força de trabalho pagando um preço chamado salário, e se apropria do produto do uso dessa força, é membro de outra classe. Esse comprador é um patrão e pertence a classe capitalista que tem também outros integrantes conforme os seus papeis no mecanismo de circulação do capital.

As classes não são homogêneas. Há diversidade de situações e de interesses entre seus membros. Tanto um gerente de alto escalão em uma grande empresa e que recebe salário altíssimo, quanto aquele empregado de salário mais humilde e que recebe uma merreca na mesma empresa, ambos pertencem à classe trabalhadora.

O dono de uma carrocinha de pipoca que paga salário a um menino como empregado ajudante, está na posição de um capitalista. Um médico que trabalhe para um hospital, mas que também tenha um consultório próprio com empregados para limpeza, atendimento enfermagem etc. estará no papel de membro da classe trabalhadora como empregado do hospital, e no papel de capitalista enquanto dono do consultório.

Um aspecto importante dessa relação de compra e venda: salário x força de trabalho é que se trata de uma relação de troca legal, regulamentada e socialmente aceita por ambas as partes. Não se trata de um roubo ou burla, embora em quase a totalidade das vezes haja um enorme desequilíbrio de poder na relação e no estabelecimento de seus termos.

Outro aspecto, talvez fundamental dessa relação,  é que o trabalhador não vende o seu trabalho. Ele vende a sua força de trabalho sobre a qual o comprador passa a ter o direito uso como qualquer outra mercadoria que tenha comprado, assim como o trabalhador faz o que quiser do salário que receber pela venda.

Na medida em que o comprador (capitalista) também possui materiais, ferramentas, instalações e outros recursos ele põe em ação a força de trabalho que comprou e se apropria da mercadoria que essa força produzir durante o tempo a que tem direito.

A força de trabalho vendida pode ser de qualquer natureza. Manual ou intelectual. O trabalhador pode ter qualificação profissional ou não. E a atividade pode ser exercida em qualquer ambiente – num escritório, numa oficina, na rua ou mesmo na residência do trabalhador - com ou sem o auxílio de ferramentas ou instrumentos que, por sua vez, podem até ser da propriedade e responsabilidade do trabalhador (situação ideal para o capitalista).

Desse modo, quem pertence a classe dos trabalhadores  certamente tem interesses comuns com outros integrantes da sua classe, ainda que não estejam todos reunidos no mesmo local, vestindo uniformes idênticos, trabalhando para um mesmo patrão, na mesma empresa, ou assentados em diferentes situações econômicas.

Não é preciso desenhar para se concluir que esses interesses conflitam com os interesses dos capitalistas. Não porque uns sejam “bons” e outros “maus”. O pertencimento de classe não é uma questão de separação entre boas e más pessoas. Não se trata de uma relação moral nem ética. Os interesses são naturalmente conflitantes porque o modo de produção capitalista funciona assim.

Esse conflito é chamado de luta de classes e não é uma invenção de sindicalistas, socialistas ou comunistas. A luta de classes é uma decorrência lógica das relações da produção capitalista que a classe de maior poder sempre tenta esconder porque assim esconde a sua posição privilegiada na relação.

A evolução tecnológica das ferramentas, máquinas e instrumentos de produção, ou seja, dos meios de produção, modificou completamente a imagem tradicional de classe trabalhadora como grupo de empregados reunidos no galpão de uma fábrica realizando atividades orientadas por uma hierarquia de monitores, supervisores, gerentes ou coisa que o valha.

As modificações são de tal ordem que há mesmo o caso de trabalhadores nem se reconhecerem como integrantes de sua classe. Esse “não reconhecimento” já existia no caso de trabalhadores com diferentes status econômico. Sempre foi o caso dos empregados de altos salários e aqueles que ganham merrecas. Mas,  a evolução tecnológica trouxe novas situações. Há trabalhadores que se imaginam como capitalistas, empreendedores ou “prestadores de serviços” quando, na verdade, estão no limite máximo das aspirações do capital, ou seja, apropriar-se do produto do seu trabalho ao menor custo possível.

O fato é que a realidade tomou outros aspectos, mas as relações de produção permanecem porque elas são inerentes ao capitalismo. A luta de classes existirá enquanto existirem as classes, e essas só deixarão de existir quando o modo de produção capitalista for superado.

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sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

Gostaria de aliviar, mas não tem clima pra isso!

 Opinião

 

Ouvimos, vemos e lemos sobre a crise climática, mas para nós, leigos, além dos aspectos concretos da própria crise, enchentes, secas, queimadas, furacões,  não é muito fácil a compreensão e assimilação do tamanho dessa coisa.

Sabemos que um dos principais aspectos da crise é o aquecimento do planeta decorrente da alta concentração de certos gases na atmosfera levando a níveis indesejados aquilo que deveria ser nossa proteção natural, o tal do Efeito Estufa.

São vários os gases que provocam o efeito estufa, mas o principal deles é o  dióxido de carbono (CO2) emitido principalmente pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento. E para quantificar em uma medida única a emissão de diferentes gases de efeito estufa (GEE) criou-se o termo dióxido de carbono equivalente (CO2e).

Atualmente, considera-se que o CO2 seja o principal responsável pelas emissões mundiais de gases de efeito estufa (GEE) que bateram novo recorde em 2023 e chegaram a 57,1 bilhões de toneladas anuais de dióxido de carbono equivalente (CO2e), sendo o Brasil  o sexto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo. [1].

Na reunião da COP21, em 2015, em Paris, o mundo concordou em limitar o aquecimento global a 1,5°C em comparação com os níveis pré-industriais. Para tanto, a ciência diz que as emissões de GEE devem ser reduzidas em mais de 40% até 2030. 

Segundo um relatório de outubro de 2024 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, ainda é tecnicamente possível atingir a meta de aquecimento global do Acordo de Paris. Se não for assim, o mundo chegará a um aumento catastrófico da temperatura de até 3,1°C. E, ainda, mesmo que os  compromissos atuais para 2030 sejam cumpridos (e não estão) o aumento da temperatura seria de 2,6 a 2,8°C.

As nações devem se comprometer coletivamente a reduzir 42% das emissões anuais de gases de efeito estufa até 2030 e 57% até 2035, ou a meta de 1,5°C do Acordo de Paris desaparecerá dentro de alguns anos, o que traria impactos devastadores para as pessoas, o planeta e as economias. O bicho não está pegando, ele já pegou! [2]

Façamos, então, uma consideração a partir desse quadro super geral:

Imagine o mundo hoje. O tanto que o planeta está fumegando e o tanto que precisaria ainda fumegar para, no mínimo, fazer avançar as demandas das enormes populações carentes e desatendidas pelas distorções onde 15 da população mundial acumula dois terços de toda a riqueza do mundo.

Imagine o que significa provocar uma redução de 57% (mais da metade) das emissões num prazo de 10 anos (até 2035). Faça-se a aproximação que se achar necessária. A ordem de grandeza dessas quantidades não se altera.

Isso seria (ou será?) como a necessidade de dar um cavalo de pau, uma freada com freios mecânicos e de mão acionados, num automóvel se deslocando a 300 km por hora. Uma tentativa de praticamente parar o mundo.

Claro que há viabilidade técnica, mas não é disso que se trata. Trata-se de política. E vemos nos noticiários os representantes governamentais desse planeta capitalista, na maior cara de pau, assinando termos, acordos e promessas como se tudo já estivesse acordado e combinado com sua alteza  “o Capitalismo”.

São quase 60 bilhões de toneladas de CO2e despejados na atmosfera  por ano, praticamente o dobro desde o ano de 1990, e os caras assinam promessas de reduzir esse despejo em mais de 50% num prazo de 10 anos. Me engana que eu gosto!

E alguns de nós é que somos apontados como sonhadores românticos ou ridículos  quando insistimos em nossas convicções sobre o socialismo e sobre a necessidade de enfrentar, lutar e superar o capitalismo.

Até mesmo alguns companheiros engajados acusam-nos de esquerdismo quando cobramos do governo Lula um enfrentamento mais assertivo com o capitalismo, sem perceberem que o tempo de preparação da revolução já passou.

Grande parte da população, incluindo alguns companheiros de luta, assiste passiva e credulamente a TV mostrando os sorridentes representantes do capital prometendo que abrirão mão de seus lucros e que darão o cavalo de pau no mundo para a necessária redução de bilhões de toneladas de GEE.

Afinal, quem são os sonhadores nessa história?  #####

 

[1] https://revistapesquisa.fapesp.br/producao-de-gases-de-efeito-estufa-cresce-13-no-mundo-mas-cai-12-no-brasil/

 

[2] < https://www.unep.org/pt-br/noticias-e-reportagens/comunicado-de-imprensa/nacoes-precisam-fechar-enorme-lacuna-de-emissoes-em>