quarta-feira, 1 de abril de 2020

A vida em tempos de coronavírus (13)


Opinião


Penso nas coisas da vida como quase todo mundo, e também sem a pretensão de serem indagações filosóficas. Minhas especulações sobre o ser humano, a natureza, o planeta e o universo dividem espaço (e geralmente perdem) com dúvidas abissais sobre o que vou preparar para comer. Isso quando as questões sobre a manutenção da casa e  a lavagem da roupa já estão superadas.

Busco, então, fontes que conheço e outras sugeridas por dicas, para refletir a partir delas. Vou catando aqui e acolá tentando avaliar as possibilidades de transformação do mundo e os  desdobramentos sociais pós-crise coronavírus.  As avaliações de certas figuras são sempre educativas e nem sempre consensuais. Vão desde os cenários pessimistas até os otimistas esperançosos.

Ao mesmo tempo, e também por dicas de amigos, acompanho notícias sobre ações de gerenciamento econômico da crise que são reveladoras tanto de interesses como de interessados. As manchetes dessas notícias algumas vezes disfarçam a realidade, e mesmo os seus conteúdos passam batidos quando as atenções estão voltadas para a quantidade de contaminados e de mortos pelo coronavírus.

Recolhi, então, algumas notícias recentes cujos títulos eu reproduzi na íntegra e em caixa, alta entre aspas, seguidos da releitura dos seus conteúdos que fala por si e dispensa comentários adicionais:

“PARA DEPUTADOS DO NOVO, GOVERNO PRECISA FAZER INTERVENÇÃO” [Valor Econômico – RJ – 20/03/2020]
Trata-se de reivindicação do partido Novo, ultra neo liberal, pedindo  verba do governo para reforço do capital de giro das empresas. O mesmo partido que prega o fim do Estado e dá suporte ao governo para o corte de verbas para a saúde, educação, e transporte, além das ações para acabar com os funcionários públicos e aposentados.

“GOVERNO ASSUME RISCO E BANCO DEVE REATIVAR OFERTA DE CRÉDITO”  [Valor Econômico – RJ – 30/03/2020]
Essa notícia relata que os bancos pararam de emprestar dinheiro alegando medo de quebradeira generalizada. “Isso é problema do governo” disseram os bancos. O governo então está repassando 40 bilhões de reais para os bancos que emprestarão às empresas cobrando juros. E o Tesouro arcará com 85% do risco. O mais caricato é que os bancos fizeram propaganda junto aos micros e pequenos empresários em nome do Bradesco, Itaú e Santander. Salários dos trabalhadores garantidos por dois meses. “Tudo que a gente quer é que você cuide da sua saúde sim, mas mantendo sua empresa viva” – diz o comunicado dos bancos.

“CONSTRUÇÃO DE HOSPITAL DA FIOCRUZ TERÁ APOIO DO ITAÚ” [Valor Econômico – RJ – 31/03/2020]
Quem ler essa notícia sem crítica não valorizará como esse apoio “filantrópico” é operacionalizado. Na verdade, a grana, R$ 10 milhões, é repassada para o hospital  via o Instituto Unibanco e a Fundação Itaú para a Educação e Cultura, um mecanismo legal, ao qual as grandes corporações recorrem para obter reduções no Imposto de Renda.

“DONOS DO GRUPO VOTORANTIM DOAM R$ 50 MILHÕES” [Valor Econômico – RJ – 31/03/2020]
Ora, quem não te conhece que te compre! A informação está no corpo da notícia. O dinheiro do grupo vai para uma conta do Instituto Votorantim na mesma linha do mecanismo utilizado pelo Itau.

Enquanto isso, outra notícia diz assim: “VAREJO ACUSA BANCOS DE ELEVAR JUROS” [Valor Econômico – RJ – 30/03/2020]
A notícia refere-se a uma recorrência das associações de grandes varejistas junto ao governo denunciando o aumento expressivo da cobrança de taxas de juros pelos bancos após o início da crise que, em certos casos,  chegam a ser superiores a  70 por cento.

Com essas e outras, recorro a uma reflexão do sul coreano Byung-Chul Yang, um dos caras aos quais me referi no início desse texto:

“O vírus não vencerá o capitalismo ... Não podemos deixar a revolução nas mãos do vírus. Precisamos acreditar que após o vírus virá uma revolução humana. Somos NÓS, PESSOAS dotadas de RAZÃO, que precisamos repensar e restringir radicalmente o capitalismo destrutivo, e nossa ilimitada e destrutiva mobilidade, para nos salvar, para salvar o clima e nosso belo planeta” [ El País – Brasil – 22/03/2020]
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