domingo, 10 de maio de 2020

A vida em tempos de coronavírus (52)


Opinião


Um Dia das Mães bem estranho. É certo que há bastante tempo eu acho Dia das Mães um troço bem avacalhado e sem significado para mim, mesmo quando ainda tinha a minha. A data tem origens controversas, mas hoje não passa de um artifício comercial com recordes de vendas nos dias que antecedem. De qualquer forma, hoje não poderia deixar de estar estranho, é o primeiro Dia das Mães em meio a pandemia do coronavírus. Tomara que seja o único.

Como as famílias estão, em grande número, praticando o isolamento social, muitas mães que já são avós possivelmente estarão isoladas, sem a companhias dos filhos e netos. Certamente isso é motivo de uma tristeza não superada pelas vídeo chamadas via celular. O lado positivo é que muitas mamães não estarão sofrendo maus tratos em restaurantes. Geralmente uma porção de filhos resolve “compensar” suas mães no “seu” dia e, em vez de preparar, eles próprios, alguma recepção confortável para a mamãezinha, levam-nas para almoçar fora.  O que se vê nas ruas da cidade são filas enormes nas portas de restaurantes e churrascarias, cheias de velhinhas esperando a liberação de alguma mesa onde, apertadinhas e desconfortáveis, serão maltratadas pelos garçons atrapalhados no atendimento da casa lotada e prestando um péssimo serviço.

Aqui, no Rio, o Zeca Pagodinho montou uma apresentação ao vivo com acompanhamento musical e transmitida pelo youtube. Não faço ideia do local físico – acho que nem foi divulgado – mas ele esteve lá, numa belíssima apresentação. Os músicos afastados entre si e o único público, ao que pareceu, foram moradores da vizinhança que puderam assistir pelas janelas. Estava lá, afastado do Zeca e conduzindo musicalmente o show o maravilhoso Paulão 7 Cordas, um dos grandes artistas musicais do nosso país.

Essas tais de “lives” (hoje estão programadas várias) passaram a fazer parte das nossas vidas isoladas, e as cenas do show do Zeca, em que pese a beleza do show, foram de um significado que nada tem de belo. Não sabemos como será a vida após o coronavírus, mas se a impossibilidade de proximidade e de contatos, como as cenas que temos assistido, se tornarem uma prática obrigatória, arrisco dizer que nosso futuro estará fudido. Os seres humanos, pelo menos essa espécie que conhecemos, não suportarão. Naturalmente a adaptação ocorrerá, mas os adaptados formarão quase uma outra espécie. O coronavírus terá sido o marco da nossa transformação.

Usarei esse Dia das Mães como uma referência simbólica do término de uma prática que iniciei junto com o isolamento social: escrever diariamente nesta serie “A vida em tempos de coronavírus”. Hoje interromperei a sequência. Sem motivo especial, apenas para dedicar o tempo a outras tarefas sem o compromisso comigo mesmo de alguma redação diária. Sempre usei o blog como um caderno de anotações e continuarei usando, mas sem a rotina diária a qual me obriguei no começo do isolamento.  

Nas datas de Dia das Mães e Dia dos Pais, há algum tempo, com alguns amigos celebramos o dia dos “sem mães” ou “sem pais” bebericando juntos umas cachaças e provando uns tira-gostos. Hoje a celebração será isolada, típica da vida em tempos de coronavírus.

#####

Nenhum comentário:

Postar um comentário