quinta-feira, 12 de setembro de 2024

História de vinho e fogo

 Leituras para distrair

 

Nesses tempos de insuportáveis securas e queimadas, lembrei uma experiência que já contei algumas vezes, mas não lembro de ter registrado. Uma viagem em Rondônia, anos 80,  seguindo a rota de rádio da Embratel. Fazíamos um percurso de retorno, desde a cidade de Vilhena, sul do estado, passando por Ji-Paraná, até a capital Porto Velho.

Tomando-se como referência o lado brasileiro (Rondônia faz fronteira oeste com a Bolívia),  Vilhena é, ou era, a entrada na região amazônica para quem chega do Sul através do Mato Grosso. Talvez a principal cidade ao sul de Rondônia, na época um estado recém-criado. Para os caminhoneiros, as enormes antenas de tropodifusão da Embratel em Vilhena eram uma referência. Um portal da Amazônia.

A rodovia era ladeada pela floresta em ambas as margens, e seguíamos  desconfortáveis em uma Kombi durante a noite.

Muitas queimadas. O aeroporto de Porto Velho interditado parte do tempo devido a fumaça. A viagem foi assustadora para mim, porque viajamos  atravessando um corredor de fogo durante enorme parte do percurso. O motorista e um acompanhante local viam tudo com naturalidade. Eu me cagava de medo.

As queimadas eram bem afastadas da estrada, mas à noite pareciam próximas e que avançariam sobre nós. O que se via era como dois intermináveis paredões de fogo margeando a estrada, uma visão assustadora que não esquecerei.

Em dado momento, em meio aquele vazio total, deparamos com um posto comercial de parada. Era um restaurante e tinha também outros serviços, mas durante a madrugada estavam fechados, apenas o restaurante aberto. Paramos e eu ansiava por uma bebida que não fosse água nem refrigerante ou suco. O restaurante era grande, de propriedade e administrado por um casal. Foi quando aconteceu o fato inesquecível e razão das lembranças e desse registro.

Eu esperava algo como uma cervejinha mambembe e choca quando a dona abriu uma geladeira – querosene – e sacou uns belos vinhos gaúchos e gelados. Era madrugada, mas a cozinha produziu deliciosos bifes que fizemos desaparecer embalados pelo vinho. Conversa vai e vem, soubemos que o casal era paranaense, uns dos tantos sulistas que ocuparam aquela região da Amazônia. Eram muitos deles.

A parada e o encontro foram agradabilíssimos. Hoje sinto frustração por não ter registro preciso sobre o local ou trecho da viagem. Difícil imaginar que não existia celular e nem  máquina fotográfica disponível naquele momento. Mas, ficou a memória, ainda que com suas imprecisões. Retomamos nossa rota. O fogo já não pareceu tão assustador. Chegando em Porto Velho deveríamos seguir para Rio Branco, no Acre, mas esperamos ainda um ou dois dias até que houvesse condições de voo proibido pela fumaça.

Em tempo: Esses fatos ocorreram na viagem de retorno. Eu escrevi (em 2018) sobre a viagem de ida, num texto que dei o título “ Múmias Incômodas. ” Para quem se interessar, o link é:

https://blogdojorsan.blogspot.com/2018/09/mumias-incomodas.html

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