quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Papai Noel! ... Papai Noel!

Leituras para distrair 

Muitos dos bairros da cidade de São Gonçalo (RJ), na década de 60 do século XX, identificavam-se a partir de suas “praças” que eram núcleos em torno dos quais e em cujas proximidades concentrava-se um comércio que atendia à população local. 

A geografia da cidade podia ser esboçada assinalando-se as tais praças e suas interligações. Algumas próximas entre si, umas mais dinâmicas que outras, cada uma com histórias e tipos caricatos próprios. Na época, sob o aspecto da movimentação comercial, os bairros Zé Garoto, Rodo e Alcântara e suas respectivas praças já se destacavam entre os demais. 

O nome estranho, bairro do “Rodo”, devia-se ao fato de ser o ponto final de uma das linhas de  bondes da cidade que, ao chegarem à praça, “rodavam” percorrendo um círculo formado pelos trilhos e retornavam aos pontos de origens das linhas. No Rodo, uma figura bem popular  era um colega, um pouco mais velho que eu,  cujo apelido era “Arroto”. Ele respondia ao apelido sem qualquer contestação ou constrangimentos. Também seus familiares o tratavam assim: “Fulano Arroto” (seu nome eu omitirei). 

Arroto ganhou o apelido porque conseguia eructar com uma facilidade enorme. De forma impressionante, ele modulava o arroto pronunciando palavras e até frases enquanto arrotava. As pessoas pediam e ele se exibia com seus arrotos altos e prolongados. Inacreditáveis. 

O assunto pode ser um tanto escatológico, até grosseiro, mas o melhor sinônimo que encontrei para o verbo arrotar foi o tal de eructar que usei no parágrafo anterior. Mas, enfim, Arroto era um fenômeno. Fazia jus ao apelido e orgulhava-se disso. 

Certa vez, era proximidade do Natal quando o comercio do Rodo promoveu uma carreata festiva. Tinha bandinha, buzinaço,  balões de ar, etc. Os carros tinham decorações natalinas diversas e patrocinadas pelas lojas que promoviam a carreata. Em um dos carros desfilava um Papai Noel  que acenava e mandava beijos para o povo e para a criançada que respondia das calçadas com palmas. 

As lojas de comercio intercalavam com residências, e o público era também grupos de conhecidos ou vizinhos, além dos passantes. Pessoas que estavam em casa e vinham aos portões para ver a carreata. Nada a ver com canários atuais, lá se vão mais de 50 anos. 

Estávamos em uma das esquinas, em grupo, e a carreata desfilava lentamente enquanto a garotada gritava: Papai Noel! ... Papai Noel! ...  Papai Noel! Uma alegria só.

Quando o carro do Papai Noel passou em frente à nossa galera o velhinho fez o tradicional aceno de saudação, mas complementou com um gesto especial que era bem familiar para todos nós. Papai Noel estufou o peito, tamborilou a barriga com uma das mãos, altura do estômago, e emitiu um sonoro e prolongado arroto que sobressaiu de todas as outras manifestações. 

Dizem que ele falou “Feliz Natal”. Mas, o susto e a gargalhada geral seguida ao susto não permitiu a confirmação. O fato é que o Papai Noel repetiu o aceno carinhoso de saudação e prosseguiu em carreata que dispersaria mais adiante.

 Sim, o sacana do Papai Noel não era outro além do Arroto, fantasiado e desfilando para a loja que patrocinava o carro. Fazia um “bico” para garantir o seu Natal. O desfile entrou para o folclore da esquina, e a história contada e repetida pelos que estavam lá e pelos que só tomaram conhecimento.

#####


Nenhum comentário:

Postar um comentário