segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

O fim da vida, sem direito a Bis

Opinião

 

Nas primeiras linhas, do primeiro capítulo, da primeira seção do primeiro volume da sua obra O Capital, há mais de um século e meio, Karl Marx escreveu assim:

“A riqueza das sociedades onde reina o modo de produção capitalista aparece como uma “enorme coleção de mercadorias”, e a mercadoria individual como sua forma elementar” 

O sacana do Marx compreendeu, definiu e ensinou sobre o núcleo do modo de produção em que ele vivia: o modo capitalista ou capitalismo. Surpreendentemente para muitos em suas primeiras leituras, o tal núcleo não é o trabalho, nem o homem, nem a exploração, muito menos a revolução. O núcleo é a mercadoria.

No capitalismo tudo é tomado como mercadoria, se não for, não tem vez no sistema. Quem tiver alguma  mercadoria pode ir ao mercado e tentar trocá-la por outras que poderá consumir para sua sobrevivência. Quem não tiver está fora. É descartável.

E prosseguiu Marx:

“A mercadoria é, antes de tudo, um objeto externo, uma coisa que, por meio de suas propriedades, satisfaz necessidades humanas de um tipo qualquer. A natureza dessas necessidades – se, por exemplo, elas provêm do estômago ou da imaginação – não altera em nada a questão. Tampouco se trata aqui de como a coisa satisfaz a necessidade humana, se diretamente, como meio de subsistência, isto é, como objeto de fruição, ou indiretamente, como meio de produção”

(Nota: Essas traduções foram copiadas das edições de O Capital da Editora. Boitempo) 

O velho Mouro viu muito além do seu tempo. Mas, não cometamos o equívoco de imaginar que ele profetizou ou idealizou os dias de hoje. Não!  Ele não era mágico e nem fazer idealizações era a sua praia. Materialista, ele  pensava no mundo a partir das suas experiências e das realidades que conhecia e, ainda assim, ele viu o coração do sistema – a mercadoria. Aliás, esse é o título do Capítulo 1 de O Capital. Ovo em pé. Depois que alguém mostra a solução ela parece óbvia.

Hoje os jornais informam que o  estádio de futebol Morumbi será, a partir de janeiro de 2024 e durante os próximos três anos chamado de MorumBis – uma referência à marca de chocolate Bis. Um negócio de 75 milhões de reais. Alguém vendeu e outro alguém comprou o nome do estádio!

O tipo do negócio chama-se “naming rights” e a mercadoria é o “nome” do estádio. A mercadoria atende às necessidades humanas. Se elas provêm do estômago ou da imaginação – não altera em nada a questão. Essa assertiva foi estabelecida pelo Mouro há mais de 150 anos.

São muitos os exemplos de “naming rights”. Negociações similares já foram feitas pelos clubes Palmeiras e Corinthians. Em 2021 os jornais anunciaram uma crise no Metro RJ que vendeu o nome da estação Botafogo que passou a se chamar: Botafogo/Coca Cola.

Muitos comentarão com indiferença que capitalismo é isso mesmo, vida que segue, mas sem compreender ou considerar a abrangência desse modo de produção que entende tudo como potencial mercadoria.

Marx foi além. Apontou que o futuro do capitalismo é a extinção da nossa espécie, na medida em que até mesmo a natureza que viabiliza a vida humana no planeta será consumida como “mercadoria”. E tem gente que acha que a bandeira de fim do capitalismo é coisa de comunista e de sonhador inconsequente.

Superar o capitalismo é imperativo se o ser humano não quiser ser o seu próprio algoz. Tarefa de quem ainda está ou estiver por aqui. Que venha 2024!

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