Leituras para distrair
Achei esse
texto legal e copiei para compartilhar. Gosto muito do autor e lembrei-me de um
monte de gente que guardou da física a imagem daquela disciplina obrigatória e aporrinhante
do ensino médio.
Houve
uma época em que o mundo parecia simples
Autor:
Carlo Rovelli [1]
Depois mudamos de ideia. Nos séculos subsequentes, compreendemos aspectos da realidade. Descobrimos gramáticas ocultas, encontramos estratégias para nossos objetivos. O pensamento científico construiu um complexo edifício de saberes. A física foi a força motriz e unificadora, oferecendo uma imagem nítida da realidade: um vasto espaço onde correm partículas, impelidas e atraídas por forças. Faraday e Maxwell acrescentaram o "campo" eletromagnético, entidade difundida no espaço através da qual corpos distantes exercem forças um sobre o outro. Einstein completou o quadro, mostrando que também a gravidade é levada por um "campo": um campo que é a própria geometria do espaço e tempo. A síntese é clara e encantadora.
A realidade é uma estratificação exuberante: montanhas nevadas e florestas, o olhar dos amigos, o estrondo do metrô nas sujas manhãs de inverno, nossa sede irrequieta, o deslizar dos dedos na tela do celular, o gosto do pão, o sofrimento do mundo, o céu noturno, a imensidão das estrelas. Vênus brilhando solitária no céu azul ultramarino do cerpúsculo... Pensávamos ter encontrado a trama de fundo desse pulular caleidoscópio, a ordem oculta atrás do véu desvendado das aparências. Era o tempo em que o mundo parecia simples.
Mas, para nós, minúsculas criaturas mortais, as grandes esperanças não passam de breves sonhos. A clareza conceitual da física clássica foi varrida pelos quanta. A realidade não é como descreve a física clássica.
Foi um despertar brusco do sonho feliz em que nos tinham embalado as ilusões do sucesso de Newton. Mas é um despertar que nos leva ao coração pulsante do pensamento científico, que não é feito de certezas adquiridas: é um pensamento em movimento contínuo, cuja força é precisamente a capacidade de recolocar sempre em discussão todas as coisas e começar de novo, de não ter medo de subverter uma ordem do mundo para buscar uma mais eficaz, e depois voltar a colocar tudo em discussão, subverter tudo de novo.
Não ter
medo de repensar o mundo é a força da ciência: desde que Anaximandro eliminou
as colunas na qual a Terra se apoiava, Copérnico a pôs a girar o céu. Einstein
dissolveu a rigidez da geometria do espaço e do tempo, e Darwin desmascarou a
ilusão da alteridade dos humanos... A realidade se redesenha continuamente em
formas cada vez mais eficazes. A coragem de reinventar profundamente o mundo:
esse é o fascínio sutil da ciência que capturou as rebeliões da minha
adolescência... ###
[1]
Copiado, sem autorização, do livro "O abismo vertiginoso – um mergulho nas ideias e nos efeitos da física quântica" – Carlo Rovelli – Ed. Objetiva
Carlo Rovelli é físico teórico italiano, membro do Instituto
Universitário Francês e da Academia Internacional de Filosofia da Ciência,
professor do Centro de Física Teórica da Universidade Aix-Marseille.
Especialista no estudo da gravidade quântica.
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