sábado, 23 de novembro de 2019

Consciências aprisionadas


Opinião

Na quarta-feira última, 20 de novembro, o clube Renascença tinha bastante gente, mas estava vazio. Entrada franca. Teve banda do Corpo de Bombeiros, feijoada, apresentações de conjunto de choro, grupo de jongo, casais em dança de gafieira, roda de samba e artistas diversos. Barraquinhas de artesanatos e diversos produtores oferecendo degustação de cachaças da melhor qualidade. Ainda assim, vazio. Sabemos bem o que é um dia de casa cheia no clube para fazer essa afirmação.  

Ao mesmo tempo, as imagens de celular mostravam uma multidão de torcedores acompanhando o ônibus que levava o time de futebol do Flamengo até o aeroporto do Galeão. Uma multidão que tomava totalmente o caminho e não distinguia obstáculos, chegando a pisotear veículos que estavam parados atravancando o seu caminho, que derrubou grades, provocou feridos  e reação violenta da polícia.

A data em pauta foi instituída por lei como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Aqui, no Rio de Janeiro, é um feriado estadual e celebrada com manifestações em diversos locais, entre eles o clube Renascença cuja origem e história transformaram o “Rena” em um símbolo de enfrentamento dos negros contra a discriminação racial. Nesse ano, 2019, na mesma data, a equipe do Flamengo embarcou para a cidade de Lima, no Peru, onde disputará, hoje, 23 de novembro, daqui a pouco, com o time argentino River Plate,  a taça Libertadores da America.

Foram duas manifestações populares. Seria um equívoco desvalorizar qualquer uma delas em prol da outra. Dois públicos felizes, isso é o que importa. Afinal esse é o objetivo final das lutas sociais. Contudo, também não há como ignorar as possíveis motivações que determinaram a opção pela participação em um ou outro evento. Um deles celebrou a consciência. Outro foi uma manifestação explícita de alienação. Não se comparam.

O resultado da partida de hoje, sábado,  qualquer que seja, provocará outro impacto na vida da cidade e das pessoas. Alegrias e tristezas consoantes com as emoções que determinam a relação dos cariocas e dos brasileiros em geral com o futebol.

Eu prefiro ver as pessoas felizes. Então, preciso supor que essa alegria alienada deve ser tão grande que supera a infelicidade de um cenário sem aposentadoria, sem proteção de leis trabalhistas, de desmonte do sistema educacional, de extinção da saúde pública através da sua privatização, de entrega das riquezas nacionais, de subordinação ao capital privado, de desemprego, de preconceito e discriminação social, além da criminalização da pobreza e da miséria. Não fosse assim eu teria que classificar essas pessoas apenas como idiotas, mamulengos de uma ordem política fascista. Não tenho essa presunção nem acho que as decepções esportivas farão aumentar as fileiras dos participantes ativos na vida política do país. Escolhi apostar que o engajamento e consciência virão de outras disputas.

####

3 comentários :